"Eu sou o avesso do que vocês sonharam para os seus filhos. Eu - TopicsExpress



          

"Eu sou o avesso do que vocês sonharam para os seus filhos. Eu sou a sua filha amada pelo avesso. A minha embalagem é de pedra mas meu avesso é de gesso. Toda vez que a pedra bate no gesso me corta toda por dentro. Eu mesma me corto por dentro, só eu posso, só eu faço. Na carne externa quem me corta é o mesmo que admira esse meu avesso pelo lado de fora. Eu sou a subversão sublime de mim mesma. Sou o que derrama, o que transborda da mulher. Só que essa mulher sou eu, sou o que excede dela; Ou seja, eu sou ela com um plus, com um bônus. Sou a mulher que tem força de homem, que tem o coração trabalhado no gelo. Que pode ser várias, uma em cada dia da semana. Eu tenho o cabelo que eu quiser, a unha da cor e forma que de desejar. Os peitos? Do tamanho que eu quiser, e do material que eu puder pagar. O que eu não trocaria por uma armadura medieval, uma prótese blindada, talvez. A prova de balas, a prova de facas. Uma prótese dura o suficiente para me proteger de um tiro e maleável o suficiente para ainda deixar o amor entrar. Bailarina troglodita das pernas de pau. Eu fui expulsa da escola de dança e aprovada em primeiro lugar na escola da vida. O vestibular de morte, na cadeira da “bombadeira” foi a minha primeira lição. Era a pele que crescia e me dava a aparência que eu sonhava. Era o suor frio que me descia pelas têmporas oriundo do meu medo de morrer. Com o pode? A Morte e a beleza andar de mãos dadas? No mesmo trilho de uma vida marcada por dedos que apontam ate o fim da existência. Até eu estar deitada, imóvel, gelada num caixão barato que certamente um grupo de amigas ajudou pagar. Na minha esquina? Lá as esquinas tem donos. De dia os flanelinhas que arranham teu carro se você não os pagar; à noite, as donas das ruas: meninas, mulheres como eu, ou como outra qualquer, usando um pedaço de tecido fingindo ser uma saia, brincos enormes, capazes de fazer uma mulher comum perder o equilíbrio e um salto de acrílico de altura inacessível, uma contradição como quão vulnerável ela fica, como quão vulnerável ela é. Ela merece uma medalha. Para o carro. O resto de um homem que está entre o banco e o volante faz o sinal. Ele quer ser mulher! Uma mulher mais feminina que ela, talvez. Porque dessa vez os litros de silicone, os cabelos comprido, o tal brinco gigante não impressionaram a ele. O seu desejo é pelo o que ela não mostra nas ruas; ela dessa vez, vai ter que se ver como homem outra vez, E a vida passa. Muitas morrem, outras nascem cada vez mais novas, mais alheias; com certeza alheias a todas as adversidades que vão enfrentar. Mesmo assim elas vão, desviando dos tiros, esbarrando nos preconceitos, correndo da polícia, mas sempre com um batom nos lábios e um belo salto nos pés; ela não que tomar conta do seu filho, ela é muito mais que isso – nós não precisamos de redenção, nós precisamos sim do respeito que todos podemos dá."
Posted on: Wed, 12 Jun 2013 02:37:20 +0000

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