A GINÁSTICA DA LEI Tenho assistido na televisão a alguns - TopicsExpress



          

A GINÁSTICA DA LEI Tenho assistido na televisão a alguns programas jornalísticos cuja pauta são os boletins de ocorrência policial das delegacias. Outro dia, vi um apresentador relatando um assalto seguido de morte a um posto de gasolina. O coitado do frentista foi alvejado nas costas enquanto corria do assaltante, um jovem de 19 anos de idade. Tudo filmado pelas câmeras do circuito de segurança interna. O apresentador fazia a exploração do evento. - Fecha em mim. Vejam senhores esse bandido, sem escrúpulos. Um desgraçado desse acabou com a vida de um trabalhador. Mostra a mãe do frentista. Nesse instante, aparece uma entrevista da mãe da vítima, chorando, dizendo que o rapaz era arrimo de família, ela só tinha aquele filho, que a ajudava muito. Pronto estava preparado o caldo emocional para as conclusões do jornalista. Ele começou a perguntar: “De quem é a culpa? Digam-me senhores, quem é o culpado por essas atrocidades que vitimam a cada dia as famílias? Vejam a situação dessa mãe. Quem vai agora alimentá-la?” Até eu mesmo, juiz federal, professor de Direito penal, ex-promotor de justiça, fiquei ansioso e curioso para saber de quem é a culpa. No que o ilustre jornalista conclui: - A culpa é da lei. Ela fraca, precisamos de leis fortes. Rígidas. Duras. Foi igual a um balde de água fria na minha expectativa. O jornalista simplesmente não estava querendo dar nome aos bois. A lei não cheira e nem fede. Ninguém pega a lei. Ela vive no diário oficial e nos livros. Ela não pode ir para a academia ficar forte e ganhar músculos. Não podemos condená-la criminalmente e nem civilmente. Como ela não pode se defender e ninguém têm coragem de fazê-lo, a melhor opção é atacá-la. Um verdadeiro paraíso de ideias. Está mais do que comprovado que o endurecimento da lei não resolve o problema da impunidade. Vejam o caso do tráfico de drogas no Rio de Janeiro e São Paulo após a edição da lei dos crimes hediondos que passou a punir com mais rigor essa conduta. De acordo com pesquisa realizada pelo Ilanud - Instituto Latino Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente, o tráfico de drogas aumentou consideravelmente depois da entrada em vigor da referida lei. As estatísticas criminais nas regiões metropolitanas das duas capitais cresceram vertiginosamente. No Rio de Janeiro, cidade que brilha à noite pelo consumo de cocaína, conforme Nilo Batista, de 1992 a 2002 o comércio de entorpecentes foi responsável pelo aumento de 950% nos registros da Polícia Civil. Em São Paulo, houve um implemento de mais de 300%, passando de 395 registros para 1.256. Em relação à Lei Maria da Penha, a pesquisa recentemente divulgada pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - traz resultados confirmadores de que a mudança da lei pouco influiu para a diminuição da criminalidade. Desde 2006 em vigor, o rigor da lei não reduziu o número de homicídios praticados contra a mulher. De 2001 a 2006 a taxa de homicídios cometidos contra mulheres foi de 5,28 por 100 mil. Entre 2006 a 2011 ficou em 5,22 por 100 mil habitantes. Estatisticamente, os números são praticamente iguais. Os Estados com os piores índices foram Espírito Santo com 11,2, a Bahia ficou na faixa dos 9,0 e Alagoas alcançou 8,8. Nosso problema não está na lei, mas na sua execução. A impunidade é de fato uma das principais causas da criminalidade, ao lado de outras, claro. Segundo dados do CNJ, menos de 10% dos homicídios no Brasil são elucidados. Temos a maior taxa da América Latina e, em números absolutos, nosso país é o líder mundial de assassinatos, apesar de não estarmos em guerra. Vejam também o caso da alcoolemia ao volante. A lei só pegou onde há fiscalização. A maioria das cidades, onde não há policiamento ostensivo, a direção com a ingestão de bebidas alcoólicas continua a acontecer tranquilamente. Não podemos esquecer que há meio milhão de encarcerados no Brasil, sendo que as vagas são para apenas 350 mil. Desastre total seria se os 300 mil mandados de prisão a serem cumpridos fossem executados. Não haveria lugar para tanta gente. Certo é que o caminho não é o endurecimento da legislação, mas políticas públicas, saúde, educação e emprego para a juventude. A culpa, portanto, não é da lei. Roberto Veloso é juiz federal e professor doutor da UFMA e do UniCEUMA Compartilhe com seus amigos portalaz.br/coluna/roberto_veloso
Posted on: Thu, 03 Oct 2013 17:35:33 +0000

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