A cadeia é um grande espaço de aprendizagem. Comecei a dar aulas em presídios aos 22 anos e observo que há um ciclo muito perverso. (...) Temos uma enorme fragilidade democrática. Vivemos em um sistema escravagista nos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX. E no século XX convivemos com duas ditaduras. Durante a República, quantos presidentes foram eleitos por voto direto e concluíram o seu mandato? Apenas quatro: Dutra, Juscelino, Fernando Henrique e Lula. É impressionante, há uma fragilidade institucional e estrutural. Nessa fragilidade democrática há a produção de seus inimigos preferenciais. Bauman vai chamá-los de supérfluos. Qual é a linha que separa aquele que sobrou de uma sociedade de mercado e o criminoso? É uma relação muito tênue. O processo de criminalização da pobreza é também um processo de busca de hegemonia, para legitimar as práticas mais violentas do Estado. Seja através da sua ação letal ou de seu sistema prisional. Em 1995, a população carcerária era de 148.763. Em 2009, chega em 473 mil. Há um crescimento de 318% da população carcerária, exatamente quando se estabelece o modelo neoliberal. O Brasil já é a quarta maior população carcerária do mundo. (...) Entre no presídio e veja quem está preso. Em uma ocasião, um detento me disse que eu só iria perceber o que é o presídio quando entender que aquele espaço é um pedaço da favela. É exatamente isso. O presídio só pode ser compreendido se for visto como um pedaço da favela em todos os sentidos. Em relação até ao próprio olhar do Estado para esses espaços. É o lugar das nossas amnésias, afirmou Marcelo Freixo, nesta quinta-feira (31/10), durante a abertura do seminário sobre tortura realizado pelo Comitê e o Mecanismo de Combate e Prevenção à Tortura na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro.
Posted on: Thu, 31 Oct 2013 23:25:04 +0000