A propósito da ditadura de Salazar, fala-se sempre na PIDE, no - TopicsExpress



          

A propósito da ditadura de Salazar, fala-se sempre na PIDE, no campo de concentraçom do Tarrafal, no partido único, na Censura. Di-se menos que ela foi durante décadas apoiada e aceite nom só pola grande burguesia mas pola massa da pequena burguesia e por extensos sectores dos empregados e operários. De outro modo seria impossível umha ditadura manter-se quase meio século no poder com um nível de repressom relativamente baixo (e quando digo “baixo” nom estou a minimizar os crimes do salazarismo mas a pô-los em comparaçom com o franquismo, por exemplo). Isto nada tem de estranho: num país de capitalismo atrasado e patriarcal, é fácil um regime autoritário impor umha “uniom nacional” em torno da ideia da estabilidade e da ordem, abafando as vozes contrárias. A deslocaçom do sentimento popular contra o regime foi lenta: foi preciso umha luita esgotante e isolada dos sectores operários mais avançados, primeiro os anarquistas, depois e sobretudo os comunistas, com o seu árduo trabalho subterráneo de esclarecimento; foi preciso despertar as grandes massas para a política através das candidaturas oposicionistas de personalidades conservadoras (1949, 1958); mas foi preciso sobretudo a guerra colonial estender-se ano após ano com a perspectiva da derrota à vista – para o movimento contra a ditadura ganhar boa parte da populaçom. Só nos últimos cinco anos, quando o regime, gasto, se abeirava do fim, por nom ser capaz de sair da ratoeira das guerras coloniais, se generalizárom as greves e a oposiçom à ditadura se estendeu a camadas mais vastas da pequena burguesia e do semiproletariado, da Igreja, até de parte da alta burguesia. Daí o consenso universal em torno do golpe dos capitáns, que leva tanta gente a maravilhar-se com esta revoluçom sem tiros e sem sangue. Esquecem que os cravos em Lisboa fôrom possíveis graças aos tiros e ao sangue dos guerrilheiros africanos. E por quê, durante décadas, os “democratas”, como eram chamados, hesitárom em passar à acçom? Porque receavam o vazio de poder. Tinham mais medo do povo do que do fascismo. Os 16 anos da I República tinham mostrado como era difícil manter a ordem neste país, nom por o proletariado ser especialmente forte mas por a burguesia ser fraca. Essa fraqueza crónica manifestou-se de novo no 25 de Abril: planeara-se um regime militar presidido por um fascista retinto (Spínola) e em poucas semanas já estava tudo de pernas para o ar. Impreparada para lidar com o povo após meio século de “lei da rolha”, a burguesia entrou em pánico ao embate das manifestaçons e greves; boa parte do MFA começou a vacilar, o aparelho judicial e repressivo ficou paralisado, muitos capitalistas fugírom, os líderes burgueses juravam nos comícios que eram polo socialismo. As tentativas golpistas de 28 Setembro e 11 Março fôrom tam frouxas e inábeis que quase se tornárom cómicas. De repente, o inimigo de 50 anos parecia evaporar-se. Isto criou um optimismo enganador entre os trabalhadores. Em vez de umha luita de vida ou de morte para arrancar o poder à burguesia, entrou-se no que parecia um passeio a caminho do “poder popular”. Sob a protecçom do COPCON, a ala “socialista” do MFA. Carlos Morais entrevista Francisco Martins Rodrigues, Maio de 2002, in Primeira Linha em Rede
Posted on: Tue, 22 Oct 2013 12:59:51 +0000

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