A vida dos outros Helena Celestino O único candidato a mocinho - TopicsExpress



          

A vida dos outros Helena Celestino O único candidato a mocinho nesse filme está ameaçado de ter um final infeliz. Num mesmo dia, o socialista François Hollande mostrou indignação com a espionagem americana aos seus cidadãos e curvou-se rapidamente ao pedido dos EUA de fechar o espaço aéreo da França ao avião do presidente boliviano Evo Morales. A suspeita é de que estaria a bordo Edward Snowden, o homem em nome do qual Barack Obama atropela as leis internacionais para não deixá-lo escapar da extradição. Num único movimento, Hollande acabou com os resquícios de independência da política externa francesa e sepultou a doutrina de Mitterrand de dar asilo aos perseguidos políticos mesmo em países democráticos. “É escandalosa, indefensável e contraditória a atuação do governo da França”, critica Daniel Cohn-Bendit, deputado do Parlamento Europeu. Muitos europeus perceberam a espionagem americana a cidadãos, empresas e embaixadas de aliados como mais um sinal de arrogância e desprezo pelo direito internacional, uma continuação da mesma história que já teve ataques de drones, guerra ilegal no Iraque, prisões secretas, tortura de combatentes inimigos. Em represália, alguns países e muitos políticos propuseram o adiamento das negociações do megatratado econômico da Europa com os EUA e defenderam o asilo a Snowden. Mas o discurso de defesa das liberdades democráticas perdeu a veemência quando Obama avisou que proteção a Snowden significaria rever acordos comerciais. No festival de disse-que-não-disse para disfarçar a indisfarçável submissão ao poderio econômico americano, destacaram-se França, Espanha e Equador. Hollande violou a Convenção de Genebra ao fechar o espaço aéreo ao Falcon presidencial com imunidade diplomática, mas disse que foi um banal erro do controlador de voos, pois todos desconheciam a presença de Morales a bordo do avião. A Espanha, o país europeu com maiores interesses na América Latina, adiou o sinal verde para o pouso de Morales no aeroporto das Ilhas Canárias até o momento em que isso não tinha mais importância, pois França, Portugal e Itália já tinham aberto o espaço aéreo. Tentou ficar bem com a Bolívia e Washington, ficou mal com os dois países e ainda desmascarou Hollande ao confirmar que todos receberam a informação de que Snowden estaria a bordo. O equatoriano Rafael Correa, fez uma primeira conta de quanto custaria dar asilo ao fugitivo e escolheu o ganho político. Foi olhar melhor a sua balança comercial e mudou de ideia: culpou o cônsul de Hong Kong de ter errado ao assinar um salvo-conduto para Snowden viajar rumo a Moscou e desistiu de recebê-lo. Restou um valente, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro: ele ofereceu asilo ao técnico de informática, mas não conta como vai levá-lo para Caracas. Nada chega a ser surpreendente, mas agora ficou impossível fingir desconhecimento de duas coisas: 1- Uma ameaça dos EUA faz tremer líderes políticos do mundo, independentemente de ideologias; 2- A espionagem é ampla, geral e irrestrita, os países espiam a vida dos outros - os EUA espionam, o Reino Unido espiona, a Alemanha, a França. A Declaração de Cochabamba - em que os países da Unasul manifestam indignação com a invasão de privacidade e o tratamento dado a Evo Morales - encerra a ficção de uma lua de mel entre América Latina e Obama. Certamente não mudará os planos da visita oficial da presidente Dilma aos EUA, mas deixará o clima mais tenso. Obama ficou mudo, mas o constrangimento é geral. São indisfarçáveis as digitais do presidente nessa operação mundial para caçar o ex-técnico da Agência de Segurança Nacional, ação nada favorável à sua imagem de defensor das liberdades democráticas. No último mês, multiplicam-se manifestações contra o americano em países onde ele era admirado como um popstar - aconteceu na Alemanha, na África do Sul e repetiu-se no 4 de julho, a data nacional americana, diante das embaixadas dos EUA pelo mundo. A sua obsessão para acabar com vazamentos já o levara a abrir processos contra funcionários do governo por passar informações a jornalistas. Desta vez, ele tem um motivo maior para estar preocupado: a expansão vertiginosa dos serviços de Inteligência dos EUA fez um número enorme de pessoas terem acesso a segredos capazes de criar constrangimentos semelhantes ao vazamento do programa de espionagem. O “Washington Post” repertoriou 1.931 empresas terceirizadas trabalhando para o governo americano e muitos dos seus funcionários têm críticas aos métodos dos serviços de Inteligência. A única maneira de desestimular novos whistleblowers é dar a Snowden uma punição exemplar. Apesar de ele parecer o único deste filme a brigar pelo papel de mocinho. oglobo.globo/mundo/a-vida-dos-outros-8944074
Posted on: Sun, 07 Jul 2013 21:31:25 +0000

Trending Topics



Recently Viewed Topics




© 2015