André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos faz uma - TopicsExpress



          

André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos faz uma excelente análise das manifestações sob o ponto de vista econômico: Uma Primavera Tropical . Manifestações é uma sinalização; · Sociedade em ampla mudança; · Inflação de Serviços revela mal estar; · Acomodação do consumo é desafio. Não é possível ignorar a dimensão que as manifestações contra o aumento das tarifas de ônibus adquiriram em todo o país. O grau de violência entre manifestantes e a polícia, somado a abrangências de capitais envoltas nestes distúrbios, confere ao movimento contornos outros que apenas os usuais. Por isso este Comentário de hoje irá escapar um pouco dos temas usuais e vai tentar analisar estes eventos recentes sob uma perspectiva econômica para podermos entender, e antecipar, possíveis desdobramentos. Em primeiro lugar pouco importa para nós criar um juízo moral sobre os manifestantes neste momento, o que procuramos aqui é agirmos de maneira científica e procurar alguns fundamentos deste fenômeno. A bandeira pela redução das tarifas é emblemática, mas talvez diga pouco desta dinâmica atual. Lembremos que os protestos na Turquia ou no Egito começaram por muito menos, uma simples praça que iria ser derrubada para ser construído um empreendimento imobiliário foi razão o suficiente para colocar Istambul em estado de sítio por duas semanas. O que tem em comum nestes eventos árabes é um pano de fundo de profunda mudança social, da ascensão de uma nova classe média que forçou uma reorganização política em seus países. No caso egípcio os novos consumidores confluíram para um viés mais fundamentalista de cunho religioso na medida em que era a religião o ponto comum aglutinador desta nova classe média. Já na Turquia a revolta foi justamente contra o poder secular de um líder que se perpetua no poder há anos, mas que flerta com ideias religiosas que engessam as liberdades de consumo e expressão de uma nova geração. Tal quais estes países o Brasil também vem passando por mudanças profundas (com o adensamento da classe média), e apesar de “estar tudo bem” por aqui é evidente que há ainda muitos passivos na sociedade brasileira. Para ilustramos este processo de maneira sumária trazemos os seguintes indicadores: participação na renda da camada mais pobre, anos de escolaridade de pessoas com mais de 25 anos e parcela da renda comprometida com dívidas. Os dados mais recentes mostram que uma mudança tímida, mas poderosa, de desconcentração da renda está em curso na sociedade brasileira. Os 50% mais pobres do país possuíam em 2001 pouco mais que 12,5% de toda a renda disponível da economia enquanto o 1% mais rico tinha acesso a quase 14%. Os últimos dados de 2009 mostram uma inversão – muito discreta é verdade – e os 50% mais pobres detém 15,5%, enquanto a participação do 1% mais rico recuou para pouco mais que 12%. Esta mudança mostra a ascensão desta Nova Classe Média que tem criado tantas oportunidades de negócio no país, seja no consumo diário quanto no mercado imobiliário. A média de anos de estudos subiu em 5 anos 10,62% em média no sudeste, um avanço considerável, embora insuficiente para alguns objetivos econômicos. No entanto, o dado que mais chama a atenção é o avanço do consumo turbinado via crédito, que se de um lado é positivo, força para frente o crescimento sob a ameaça constante de que um recuo pode desencadear desalanvancagens violentas em todo o tecido econômico. Em menos de uma década a parcela da renda comprometida com dívidas passou de 18% para 44%, número este ainda comportado se comparado a outras economias, mas que deixa claro que a forma usual de administrar a política econômica não pode ser mais usada. Tradicionalmente em momentos de descontrole econômico, seja por conta de déficits comerciais ou inflação galopante, o ajuste recessivo batia forte no consumo das classes menos favorecidas que acabavam arcando com parte significativa do peso do ajuste. Hoje um ajuste recessivo do tipo choque de juros traria convulsão social imediata. O déficit comercial não pode ser resolvido com a queda abrupta do consumo das famílias, o ajuste tem que ser escalonado ao longo do tempo de maneira mais harmônica, algo que o atual governo vem tentando, mas sem lograr muito êxito. O mal estar do crescimento desta bem-vinda classe média pode ser exemplificado pelo comportamento recente da dinâmica inflacionária. Nos últimos anos a inflação de serviços vem subindo de maneira consistente acima da inflação, enquanto o IPCA médio em 12 meses foi entre janeiro de 2008 e agora foi de 5,60%, a inflação do setor de serviços foi de 7,35%. Grosso modo Serviços é salário, e a alta deste grupo evidencia justamente que a parcela mais pobre do país avançou sobre a renda da parcela mais rica. Muitos economistas apontam – com razão – que o risco para inflação atual é que os salários sejam reajustados acima da produtividade do trabalhador. Este raciocínio é correto, de fato elevações de salário acima da produtividade se transformam quase que automaticamente em alta da inflação num ambiente de baixa ociosidade de fatores. No entanto, vale apontar que é justamente este o processo de redistribuição de renda que estamos vivendo. É este o mote dos últimos anos e que tem criado tantas oportunidades no Brasil. Esta redistribuição não é exclusividade brasileria e nem efeito simplesmente do Bolsa Família. Como vimos outros países experimentaram processo parecido nos últimos anos, em países tão distantes como a Turquia. O problema atual é que o instrumental usual de política econômica, em especial de política monetária, pode trazer resultados desastrosos. Tomemos como exemplo destas profundas mudanças sociais a situação dos Empregados Domésticos. A elevação dos salários desta camada da população tem criado constrangimentos à inflação oficial; os empregados domésticos foram o item que mais subiram individualmente no IPCA o ano passado ponderado pelo seu peso. O peso de empregados domésticos no IPCA, que é a inflação da camada mais rica da população em contraposição ao INCC, é extremamente elevado, cerca de 3%. Em recente relatório da OIT (Organização Internacional do Trabalho) o Brasil registra 7,2 milhões de trabalhadores domésticos, ou algo como 8% da força de trabalho (no caso das mulheres chega a 17% das trabalhadoras). Isto faz do Brasil o detentor de nada menos que 13,7% de todas as domésticas do mundo. Não por acaso alguns anacronismos vergonhosos aos olhos de estrangeiros ainda persistem na arquitetura brasileira tais como elevador de serviço e quarto de empregada. Não deixa de ser curioso que apenas após a SELIC romper o piso institucionalizado da remuneração da poupança – piso este que existia desde Dom Pedro II quando este criou a Caderneta de Poupança, também conhecida como “Poupança dos Escravos” – que o Congresso estendeu às domésticas a proteção da CLT. Controlar a inflação neste cenário implica dizer que a nova classe média tem que ser rebaixada de novo para o consumo de uma classe D e os juros fariam a recessão necessária para atingir tal objetivo. Agora isto se torna mais complexo e o curto circuito se dá justamente pelo crédito absorvido recentemente pela população; com cerca de 40% da renda tomada por dívidas uma alta nos juros muito abrupta poderia fazer um curto circuito em toda a atividade econômica. Lembremos que o Consumo das Famílias mostra claros sinais de cansaço e que já estacionou no último trimestre. A desaceleração da economia já está em curso, mas por motivos outros que fogem o atual Comentário o Banco Central está em meio a um processo de aperto monetário que pode elevar a SELIC para próxima de dois dígitos ainda este ano. O Banco Central eleva os juros para resgatar a confiança do mercado na política econômica, mas se este mesmo mercado não acredita que este processo de ascensão da nova classe média é sustentável, afinal a renda está subindo acima da produtividade, o processo de ajuste monetário se torna explosivo sendo sempre insuficiente para dar conta de reorganizar a economia brasileira à antiga ordem. Alguns diriam que o gênio saiu da lâmpada. Será impossível coloca-lo de volta. As manifestações pelo fim do reajuste do transporte público relacionam de forma indireta todos estes elementos com a política monetária, com a trajetória e credibilidade do Real. O dinheiro, já disse Keynes, é o objeto que faz a ponte do presente com o futuro e é esse mesmo dinheiro – no caso o Real – que se move entre as salas do BC e a Avenida Paulista tentando descobrir um lugar para repousar, nunca em equilíbrio, mas sim para se acomodar. Talvez este se acomode num lugar alto demais para esta nova classe média, talvez, quem sabe, a economia brasileira já adquiriu a maturidade e consistência suficiente para ser mais normal em termos do custo do futuro expresso em juros. Uma Primavera Tropical pode estar se aproximando e o país do futuro terá que decidir logo se quer viver no presente ou num futuro que nunca chega. Ordem e Progresso estão estampados na bandeira e este mote conflituoso nunca foi tão atual, afinal progresso nunca foi um processo muito ordenado. Uma Primavera qualquer começa sem mais nem menos, mas ao invés de olharmos isto como sinal de ruptura prefiro ver como sinal de vitalidade. Esta é uma das vantagens da democracia em relação a outros regimes, se por acaso ocorrer tal fenômeno este pode ser absorvido sem maiores traumas. Sobre primaveras, vale notar também, o papel preponderante que a internet joga em organizar as manifestações e o Brasil possui, segundo o Ibope Media, nada menos que 94,2 milhões de internautas sendo esta a quinta maior população conectada do mundo. Acredito que podemos dar o passo para frente sem maiores problemas, apesar de tudo acredito que o Brasil reúne as condições objetivas e subjetivas para avançar e cumpri um papel menos tacanho, investindo mais e crescendo mais. (veja todo o texto com os gráficos : bit.ly/11F1AWu
Posted on: Fri, 14 Jun 2013 20:15:55 +0000

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