Crônica de hoje para o portal Livros e Afins. Geralmente posto meus textos às terças-feiras, mas o editor do site estava em viagem, o que atrasou a publicação. Peço desculpas na singela esperança de alguém ter sentido falta. Na próxima terça, salvo imprevisto, nova crônica deve vir. AO FILHO QUE VIRÁ Que sejas forte, que sejas belo, que tenhas uma saúde invejável e nunca queiras ingerir suplementos alimentares para aumento de massa muscular. Que sentes, engatinhes, andes, corras e lides facilmente com equações de segundo grau (nessa ordem, não queiramos pular etapas). E que nesse meio tempo desenvolvas inaudita habilidade para pilotar teu triciclo Bandeirante vermelho com rodas azuis – que ainda exista tal meio de transporte em teu tempo. Que sorrias, sorrias com os olhos, com os dentes, os cotovelos, o umbigo, mas não sorrias para qualquer um, nem por qualquer coisa. Que sejas feliz, oras, que mais podemos desejar? E que tenhas personalidade própria, mas sem pretensões de autossuficiência, determinação sem intransigência, confiança sem arrogância. Que desafies aquele ditado bobo que diz “ninguém é perfeito”. Que fales francês, toques piano e saibas conduzir uma dama na dança – mas só se quiseres. Que queiras falar francês, tocar piano e saber conduzir uma dama na dança, empreendendo o esforço necessário para poder cumprir essas metas satisfatoriamente. Que não deixes teus pais projetarem em ti aquilo que não conseguiram realizar em suas próprias vidas, usando-te como meio para aliviar as próprias frustrações. Isso posto, que estejas apto a trocar o pneu de um carro na eventualidade de um incidente, que não tenhas medo de acender o fogo de uma churrasqueira, que teu desenho representando uma vaca seja distinguível daquele que representa um cachorro, que não sejas o último (nem o penúltimo, sejamos otimistas) a ser escolhido na formação dos times de futebol. Que possas inspirar comentários do tipo “que menino educado!” sem que, em bocas mais cruéis, a observação se transforme em “que moleque bobo” ou “que florzinha delicada” – o balanço é difícil, meu filho, mas tu consegues, a isso se pode chamar de “gentileza” e “elegância”. Reconhece os que zelam por ti e trata bem aqueles que nada te podem oferecer no momento. Que saibas dar nós em gravatas e domines a execução de pelo menos três bons truques com baralho. Honra teu pai e tua mãe, não mates, não furtes, não levantes falso testemunho, não desejes a mulher do próximo, não cobices os bens alheios e tenta cumprir os outros mandamentos também, por via das dúvidas. Não faças com os outros o que não queres que seja feito contigo. Sê justo, honesto, leal, íntegro, correto, altruísta, gregário e persuasivo na hora de pedir capricho na bola de sorvete. Não te metas com maconha, pó, ácido, ecstasy, fanta uva, reggae etc. E já que algumas drogas lícitas têm apelo ao qual é muito difícil resistir em nossa sociedade, ao menos aprende a preparar um dry martini decente, quando chegada for a hora. Jamais dirijas depois de beber, não te abrigues debaixo de árvores enquanto estiver chovendo e coloca já um agasalho porque está frio, meu filho. Que tenhas a sorte de encontrar para te fazer companhia uma mulher tão magnífica quanto tua mãe – ou, vá lá, um homem menos torto do que teu pai. Que te recuperes, que te ponhas logo forte quando a vida e as pessoas desta vida te machucarem.
Posted on: Thu, 06 Jun 2013 17:19:32 +0000
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