Desde sempre, rebeliões são asfixiadas pela fadiga, censura, propaganda e repressão. Subitamente, eis que a internet vira o jogo. Centavos acenderam o levante de capilaridade inédita. De repente um mar de gente que anda de ônibus, van, carro, bicicleta ou a pé, um saco de gatos de saco cheio, conectado por todo o país com muita pulsão de vida e morte. Não há liderança individual a ser neutralizada ou cooptada. A censura é praticamente impossível. Espalham-se registros filmados de abuso policial. A revolta é contra o poder, tanto o macro quanto o micro. A rebelião se nutre até do que a sufoca. Seguirá enquanto houver razões? Cabe uma análise política. A violência foi iniciada pela PM de São Paulo, talvez por haver interesse na radicalização que afunda o centro do espectro político. Foi constrangedor e emocionante ver as explicações da impossibilidade técnica de cancelar o aumento das tarifas de ônibus serem sucedidas pela adoção do impossível. Questionar margem de lucro é coisa de radicais? É preciso não desqualificar o movimento por ser de classe média ou jovem demais. Manifestação popular não é só aquela feita pelos pobres, até porque muitos foram condicionados a agitar bandeiras por dinheiro. Bem-aventurada a coragem cívica de qualquer idade, simbolizada na capa do New York Times pelo avô que encarou desarmado a tropa de choque em Fortaleza. Muitos temem golpe, mas golpe em quê? Qual partido pode altivamente proclamar-se patrimônio da nação? Silêncio... Talvez o povo não se levantasse sem o lamentável condomínio da esquerda com os poderosos, imbricado em obras, concessões públicas e doações de campanha. Desse arreglo resulta uma economia baseada em consumo, lixo, precarização dos serviços essenciais e depredação do ambiente para alimentar a fornalha chinesa que já vai se apagando. Então, se há golpe, é no oligopólio decisório. Em sua maioria os partidos não servem ao povo, bem podem ser desmanchados para que outros surjam. Mas sem reformas mais profundas os problemas reaparecerão, pois a corrupção aflige qualquer primata com excesso de poder. A onda que se ergue é a autogestão da humanidade. Com internet em 40% dos lares brasileiros, é hora de cadastrar todos para votar rotineiramente em questões específicas. Programas de computador com essa finalidade têm sido usados com sucesso na Alemanha. Congressistas, no futuro, devem decidir menos e debater mais. O povo não está preparado? Irá se politizar sem tutela. É preciso, sobretudo, disputar os rumos da mudança. Será trágico se os royalties do petróleo não forem usados para revolucionar os vergonhosos salários do magistério. É crucial investir naquilo que efetivamente dá futuro às crianças: tempo de qualidade com pais e mestres motivados e bem preparados. Redução da jornada de trabalho, salários atraentes para professores e transporte rápido e barato são pautas com um mesmo foco: viver bem. O que está em jogo é o velho sonho do povo liberto pela tecnologia, com tempo para ser feliz. A Utopia mesmo, com U maiúsculo. Mas até chegarmos à fratria vai ser preciso um profundo rearranjo. Pelo acelerar do tempo histórico, não demora muito agora...
Posted on: Tue, 06 Aug 2013 21:20:03 +0000