Desta vez, a Síria Uma intervenção militar do Ocidente na - TopicsExpress



          

Desta vez, a Síria Uma intervenção militar do Ocidente na guerra civil da Síria dificilmente atingirá seus objetivos É possível que os Estados Unidos e seus aliados venham, proximamente, a intervir na guerra civil síria. Essa operação de guerra viria em resposta à constatação de que o governo de Bashar al-Assad usou armas químicas contra os insurgentes em subúrbio de Bagdá. A lógica dessa intervenção tem duas dimensões que devem ser analisadas separadamente. Ela pode ser justificada pela aplicação algo elástica da "responsabilidade de proteger" (R2P, no linguajar dos iniciados). Trata-se da norma surgida de uma iniciativa de 2005, das Nações Unidas, baseada no princípio de que a soberania não é um direito, mas uma responsabilidade. Com base nessa definição de soberania, cabe aos estados nacionais a responsabilidade de evitar ou fazer cessar os crimes de genocídio, de guerra, de crimes contra a humanidade e de "limpeza étnica", todos englobados sob o título de crimes de atrocidades em massa. Se cabe aos estados nacionais a responsabilidade de evitar ou impedir crimes de atrocidades em massa, é de responsabilidade da comunidade internacional auxiliar os estados nacionais a assumirem sua responsabilidade. Nos casos em que os estados nacionais não assumam essa obrigação ou estejam incapacitados de assumi-la, a comunidade internacional tem a responsabilidade de aplicar sanções ao Estado omisso ou incapaz. Em casos extremos, a alternativa de última instância é uma intervenção militar. Em sendo assim, é duvidoso que mais uma intervenção estrangeira em conflitos da chamada "primavera árabe" contribua para minimizar os horrores de uma guerra civil – "uma luta de todos contra todos", descrita por Hobbes no seu “Leviatã” como aquele estado de coisas em que "a vida se torna solitária, pobre, imunda, bruta e curta". Até agora, a ingerência estrangeira em conflitos locais no Norte da África e no Oriente Médio tem provocado mais sofrimento do que alívio. Vejam-se os casos da invasão do Iraque e dos bombardeios na Líbia. A resultante tem sido a presença permanente de grandes contingentes militares estrangeiros no país em questão, como no Iraque, ou a total desestruturação política e social, como na Líbia. A segunda faceta de uma intervenção militar americana e de seus aliados é a noção de que o caos em que estão diversos países da região é danoso para os interesses americanos, britânicos e franceses – e que algo deve ser feito para colocar fim a esse estado de coisas. Novamente se cogita a intervenção militar. Se em termos de valores esse ponto de vista possa ser verdadeiro, é questionável que o seja em termos da dimensão de poder que rege as relações internacionais. A Al-Qaeda é uma ameaça real, sem dúvida, como ficou demonstrado com o recente ataque à representação diplomática americana em Benghazi, na Líbia. Mas o fato é que o terrorismo transnacional convive melhor ali, onde os governos são fracos e incapazes de combatê-lo eficientemente. É em regiões como essas que se estabelecem campos de treinamento de terroristas que, posteriormente, atacam os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a França. A grande ameaça real aos países do Ocidente desenvolvido não provém de países em estado anárquico, sem governo sobre partes substanciais de seus territórios, mas de um país estável e com governo forte: o Irã. Se o Irã estivesse em estado de anarquia, como a Líbia, não existiria programa nuclear em desenvolvimento ali e as ameaças potenciais, principalmente a Israel, seriam menores. De fato, com a situação convulsionada, tanto no Egito como na Síria, Israel se sentiria intimidado por forças convencionais desses vizinhos. Por outro lado, não há como estabelecer uma relação negativa entre democratização nessa parte do mundo e o estado caótico em que se encontram vários países da região. Democracia, no sentido moderno, é recente e estabelecida após um longo período no Ocidente. Ela é em parte consequência da Revolução Gloriosa na Inglaterra do século 17, da Revolução Francesa do século 18 e de um lento processo de aquisição de direitos civis pela população – decorrente, em larga medida, da revolução capitalista no mundo ocidental. A Primavera Árabe certamente desempenhará um papel relevante nesse rumo em direção à democracia, mas não será nunca a etapa final de um longo processo, que tomou séculos antes que deitasse raízes e se tornasse sustentável na Europa Ocidental e, depois, em várias partes do mundo. Uma intervenção militar do Ocidente na guerra civil da Síria dificilmente atingirá seus objetivos, quer estes sejam humanitários, quer sejam de preservação dos interesses de longo prazo dos países interventores. Infelizmente, não parece ser esse o ponto de vista que prevalece hoje nos Estados Unidos, na Grã-Bretanha e na França. ROBERTO FENDT
Posted on: Fri, 06 Sep 2013 05:57:38 +0000

Trending Topics



Recently Viewed Topics




© 2015