Doce Amargura: O Final de um Tempo Douglas Menezes* José - TopicsExpress



          

Doce Amargura: O Final de um Tempo Douglas Menezes* José Lins do Rego (1901 – 1957) Menino hoje não sabe o que é um carro-de-boi, muito menos ouviu sua fala arrastada e triste, como um lamento num velório. Sei, também, que a geração digital talvez nem tenha ouvido falar em José Lins do Rego. Olhar as máquinas destruírem o resto do canavial para a chegada dos galpões e indústrias pesadas para o eldorado de Suape deu-me, de repente, uma estranha necessidade de relembrar ou lembrar a obra do autor paraibano. O barulho das máquinas não escurece a memória que revive o vento batendo nas canas quase maduras para o corte. Zé Lins diz de um final de um ciclo. Cantou a Sociologia de uma região que mudava, como agora, para um momento econômico diferente dos banguês e engenhos do início do século vinte. Foi um poeta da decadência. A linguagem triste dos seus romances do ciclo da cana de açúcar, notadamente Banguê e sua obra-prima Fogo Morto, atesta todo um conjunto melancólico de um lugar, como hoje aqui, despreparado para uma mudança radical. Exército de infelizes, ricos e pobres, os personagens de Banguê e Fogo Morto. Todos a serviço da decadente região canavieira da mata pernambucana e paraibana. Genial como as ”pessoas” dessas obras fazem parte de todo o ambiente dos romances: morrem, enlouquecem, perdem tudo ou fogem para lugar nenhum. O menino de engenho Carlos de Melo é exemplo típico: o herdeiro das terras do avô é um inútil dentro do contexto. Sem vocação para a agricultura sucumbe, como os outros, foge, abandona os seus. O avô, Zé Paulino, já velho, morre, sem deixar o personagem principal de Banguê constatar que a nobreza que divulgara aos amigos da faculdade sobre o avô senhor de engenho, nada mais era que uma fantasia, uma ficção. Encontrara sim, um homem rude, de vida simplória, com a idade o fazendo mesquinho. Banguê e Fogo Morto são obras de ficção maduras, dentro do espírito do Regionalismo Moderno, na linguagem oral, principalmente, o que nos aproxima da fala do homem comum. Os dois livros são músicas, sinfonia do melancólico. Um canto que nos faz sentir o cheiro de cana, o doce do melaço, o gosto sensível dos frutos daqui. E o odor de suor do pobre homem da roça. Tristeza em todo canto. Feliz, então, o crítico Oto Maria Carpeaux ao afirmar sobre a obra de José Lins do Rego: “José Lins é brasileiríssimo. Grande Literatura. Os historiadores do futuro aproveitar-se-ão desse documento para reconstruir todo um mundo. Essa obra não morre tão cedo. É eternamente jovem como o povo, é eternamente triste como o povo. É o trovador triste da província”. Triste a obra de José Lins do Rego. Melancólica, mas de uma beleza ímpar, porque autêntica e humilde como a própria vida. Deu, o cantador da Paraíba, o sopro da existência. Fez da palavra o barro para construir uma literatura épica, voluntariosa, engajada no bom sentido. Bela, poética, como a própria vida.
Posted on: Sat, 21 Sep 2013 00:08:20 +0000

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