Em Agosto de 1787, enquanto estava reunida a Convenção de Filadélfia, que elaboraria aquela que ainda hoje é a Constituição Federal dos EUA, Thomas Jefferson, então embaixador em Paris, em carta dirigida a John Adams, dizia-lhe ser aquela Convenção uma assembleia de "semideuses" (demigods). O elogio não parece exagerado quando percebemos que uma parte significativa dos convencionalistas tinha estado na linha da frente das batalhas pela independência, mas sobretudo quando verificamos que, desde 1791 (quando recebeu os dez primeiros aditamentos) até hoje, a Constituição resistiu, apenas com alterações parciais, aos ventos da história. O segredo da Lei Fundamental dos EUA é o de ela ser pensada para seres humanos e não para anjos. Ela parte de uma conceção antropológica prudentemente cética para, através de pesos e contrapesos, conduzir a uma espécie de virtude republicana. O motor da política americana é o jogo entre duas características da representação democrática. O "espelho representativo" (os eleitos têm uma relação com os eleitores e os seus interesses) e o "filtro representativo" (em caso de colisão, os eleitos devem colocar o interesse da União acima dos interesses locais). Sempre que a América foi grande, o filtro foi mais forte do que o espelho. A paralisação orçamental do governo federal pela maioria republicana na Câmara dos Representantes, por não aceitar a derrota no "Obamacare", revela como o partido que foi de Lincoln está hoje tomado por analfabetos funcionais. O radicalismo da direita republicana reflete, apenas, o espelho baço das fações que encomendam as leis e pagam as campanhas. Mas uma Constituição que sobreviveu a uma guerra civil irá, seguramente, sobreviver a esta rebelião de indigentes. Viriato Soromenho Marques no DN
Posted on: Wed, 02 Oct 2013 20:32:31 +0000
Trending Topics
Recently Viewed Topics
© 2015