Guilherme Fonseca: Estou a começar a odiar este país. Ainda - TopicsExpress



          

Guilherme Fonseca: Estou a começar a odiar este país. Ainda não é bem odiar. Sinto-me apenas deprimido e desprezado. Não há espaço para heróis, muito menos super. Os meus amigos estão todos a ir embora. Eu não posso. Há anos que sou um recibo verde. Mais segurança social. Sempre a mais. Nunca pedi dinheiro emprestado a nada nem a ninguém, e mesmo assim conseguem que eu esteja a dever dinheiro. O meu pai morreu em Fevereiro. Deram-me 1000 euros e o número de telefone de uma agência funerária. Arranjei um segundo emprego – mais um recibo verde – para ajudar a pagar as contas. Ajudou. Um ano e meio depois faz-me subir dois escalões de segurança social. Não ajudou. Piorou. Nem as pessoas ajudam. Preferem “não pensar nisso”. É melhor assim. Tem de ser. Ou estão a dormir. Ou foram embora. As revistas enchem-se de caras de “empreendedores” que nos obrigam a “mexer ou morrer”. “Ou começas uma hamburgueria ou mereces as dívidas que tens, pacóvio”. Eu tenho 26 anos. Nunca vivi acima das possibilidades de ninguém. Nem sequer votei nas pessoas que as pessoas culpam pelas dívidas das anteriores pessoas que não permitem as pessoas governarem como as pessoas querem. Flutuamos em aguadilha de sanita, em cima de um grande “centrão de merda”, dois partidos que não prestam e que são criticados na televisão diariamente por pessoas que se fingem chateadas mas que estão a receber para estarem a fingir que estão chateadas. Pessoas de gravata e bloco de notas que gostam mais de se ouvir na televisão do que fazer sentido. Nem justiça há. Não pode haver. Ou é lenta ou não se pode aplicar. Os Polícias vão mais longe numa escadaria do que numa perseguição. Toda a gente odeia a Pepsi e esmurra máquinas de latas. Como se defender o Cristiano Ronaldo fosse estar a defender o país. Se eu chamar ao meu cão “Portugal” também lhe atiram um osso? Há uma semanas ia apanhando na boca de um taxista porque não o deixei passar à frente no trânsito. Era mais fácil o problema ser eu. Não tudo o resto. Tive pena dele. E todos os dias gozo com isto. Brinco. Faço piadas. Esforço-me. Mas chego a casa e torna-se difícil não estar mesmo chateado. Odiar. Ou pelo menos, torna-se mais difícil de gostar. Esforço-me por encontrar um bocadinho de luz, uma punchline, uma partilha numa timeline. Preciso disso para viver. Mas já nem sei bem se faço as piadas por mim ou para que os outros venham dar a mim. Faço-as. Porque são a única coisa que tenho. Está frio. Está parado. Está vazio. É assim que eu vejo Portugal. Estou quase a odiá-lo. Porque é cada vez mais difícil gostar dele.
Posted on: Tue, 26 Nov 2013 01:24:18 +0000

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