HOMERO OU HOMEROS?: Entre as várias polemicas que cercam as - TopicsExpress



          

HOMERO OU HOMEROS?: Entre as várias polemicas que cercam as obras Ilíada e Odisséia, sem dúvida a maior delas é sobre seu ou seus escritor (es). Muitos estudiosos afirmam que os poemas foram elaborados por duas ou até mais pessoas. Finley compartilha desta idéia e coloca alguns motivos plausíveis: A Ilíada esta cheia de acção dos heróis. Mesmo quando se afasta do seu tema central, a ira de Aquiles, a sua atenção jamais se separa dos feitos e dos interesses heróicos. A Odisséia, se bem que mais curta, comporta dois temas diferentes e essencialmente distintos um do outro: a narrativa das viagens de Ulisses[8] e a luta pelo poder em Ítaca. Se ela se situa na idade dos heróis, a Odisséia conhece apenas um único verdadeiro herói, Ulisses.[9] As diferenças não param por aí. Além dos lingüistas e literatos afirmarem que cada poema possui um estilo completamente diferente na forma em que foi escrito, há também a análise sobre como os poemas tratam a figura feminina: enquanto Penélope é a esposa dedicada que espera por seu amado na Odisséia, a maldosa Clitemnestra faz de tudo para prejudicar seu esposo na Ilíada.[10] Um contraste como estes não é comum em obras de um mesmo escritor, já que a moral e os costumes culturais do indivíduo são um só, principalmente e tratando de um poeta da Grécia arcaica. A geografia também auxilia nas evidências dos poemas serem escritos por pessoas diferentes e com conhecimentos diferentes: (...) a partir desta posição que a Grécia ocupa, a Ilíada esta orientada para este, a Odisséia para oeste. As relações gregas com o ocidente começaram relativamente tarde, não antes de meados do século VIII a.C., (...) Pode pensar-se, assim, que a Odisséia reflecte este novo aspecto da história grega, que utiliza os materiais tradicionais mas orientando-os em direcção ao ocidente.[11] HOMERO E A POLÍTICA GREGA: Qualquer leitor que faça uma breve análise da Ilíada percebe que o poema trata do último ano de uma guerra: a de Tróia, e que o poeta enfatiza os feitos dos grandes governantes e guerreiros, sempre ajudados por um deus. Estes heróis eram reis e imperadores de vários reinos que se juntaram a favor de Tróia VII[12] ou de Esparta os reinos que começaram a guerra que também exerciam a função de bravos guerreiros que batalhavam em favor de um ideal. Homero em muitos Cantos enfatiza feitos heróicos dos reis que estavam no campo de batalha, como a descrição no Canto XI da Ilíada, em que o rei Agamémnone toma a frente da batalha: O Atrida Agamémnone rompe na frente de todos, matando Bianor, chefe de homens, e o condutor de cavalos, Oileu, seu fiel companheiro. Este, de um pulo, saltara do carro, querendo enfrenta-lo; mas, no momento em que vinha para ele, com a lança ferido fica na fronte; não pode a celada deter a aênea lança; atravessada foi logo e, assim, o osso e, por último, o cérebro, que se desfez por completo, caiu na arrancada audaciosa.[13] Embora os personagens citados por Homero sejam fictícios[14] o poema retrata o pensamento do poeta sobre a exaltação de governantes helênicos. Segundo Finley, não são confiáveis as descrições de Homero sobre os feitos destes reis, pois o sistema monárquico grego quase não foi citado em obras e poemas diferentemente dos poemas romanos o que nos dá a idéia de que estes reis possuíam pouca importância no sistema estrutural político grego, ou seja, eram vários governantes que pouco governavam de fato, sendo que o poder estava dividido entre várias pessoas da elite: (...) apesar dos Agamêmnon e Ájax[15] dos poemas homéricos, seus verdadeiros governantes da Idade das Trevas eram chefes insignificantes dentro de uma estrutura de numerosos reis, cujo desaparecimento de cena nada teve de dramático e memorável.[16] A de se compreender que tanto a Ilíada quanto a Odisséia são chamados poemas épicos. Estes poemas exaltam os feitos de grandes heróis a maioria deles fictícios. Os dois citados poemas também foram escritos para serem recitados por bardos em público; para se dar espetáculo é preciso se escrever espetáculo, por isso há de se ter certos cuidados: de forma alguma se pode ler os poemas homéricos como fontes precisas, sendo sempre necessária uma leitura a contrapelo. Finley alerta para o cuidado na análise de poemas épicos: Contudo, o que quer que tenha sido, o épico não era história, e sim uma narrativa, detalhada e precisa, com descrições minuciosas de guerras, viagens marítimas, banquetes, funerais e sacrifícios, todos muito reais e vívidos; ele podia conter inclusive algumas sementes encobertas do fato histórico mas não era história.[17] Digamos que podemos julgar Finley como tradicional quando se trata de documentos históricos. Embora ele esteja longe de uma postura rankiana, muitas de suas análises partem de documentações mais concretas que os poemas que ele chegaria a considerar mais confiáveis pois é grande a desconfiança do autor sobre as afirmações do poeta, embora este não o descarte e, como já foi explicitado, considera sim as obras de Homero como fonte histórica, embora uma fonte um pouco menos confiável do que uma escavação arqueológica ou o inventário de algum palácio micênico. HOMERO E A RELIGIÃO GREGA: Se a Ilíada é o poema de Homero em que este trata das batalhas militares e os tratados políticos, a Odisséia é sem dúvida o poema em que Homero trata das questões religiosas e da soberania dos deuses perante o homem não que a Ilíada não trate destas questões, mas a Odisséia deixa clara a questão da supremacia divina sobre os mortais. Na célebre passagem do Canto XIII da Odisséia, em que Poseidon castiga Odisseu e seus companheiros por este tê-lo desafiado mostra toda a temência de Homero em relação aos deuses: Logo que ouviu tais palavras, Posido[18], que a terra sacode, foi para a Esquéria, a cidade onde os nobres Feácios demoram. Lá se postou. Já avançava mui célere a nau sulcadora, a aproximar-se da praia: chegou-se-lhe, entanto, Posido, a transformou numa pedra, de fundas raízes dotada, com simples toque de mão.[19] Finley não faz questão de aprofundar suas análises na religião grega. Em suas obras é perceptível que ele as usa somente como suporte para o campo econômico, tendo a religião como uma mera superestrutura influenciada pelos moldes econômicos e de produção infra-estrutura das sociedades antigas. O MITO COMO RAZÃO PSICOLÓGICA: Antes de iniciar qualquer discussão acerca da relação entre o mito e o homem, ou a necessidade do homem em crer em algum mito uma pergunta se faz necessária: O que se entende por mito? Qual é o conceito deste termo? Como isto daria discussões para diversos trabalhos e a intenção deste trabalho não é se centrar nesta discussão vejamos o que Moses Finley caracteriza como mito: Por mito refiro-me ao que, na acepção comum, geralmente significa mito e lenda, e não aos sentidos mais metafóricos, como na expressão o mito racista, ou às muitas conhecidas extensões do termo usadas por pensadores modernos como Sorel e Cassirer. Refiro-me a mitos como os de Prometeu, Heracles e a Guerra de Tróia. (FINLEY, 1989, p. 05) Nestas frases se pode perceber que Finley não tinha intenção de entrar na discussão conceitual sobre o mito, deixando isto para outros pesquisadores. O mito para ele pode ser usado até como uma prática do senso comum, como uma lenda. Com certeza Cassirer, ou Vernant, ou ainda Marcel Detienne que dedicou uma vida acadêmica acerca do estudo do mito possuem outras concepções sobre este conceito: E os mitos, como os ritos, explicam-se essencialmente pela sua função na organização social: a mitologia é a carta pragmática, constitui a espinha dorsal pragmática da civilização primitiva. Contam-se os mitos para justificar, reforçar, codificar as práticas e as crenças postas em prática na organização social, totalmente investida pelo discurso ritual. Enquanto para o antropólogo das terras birmanesas, que admite a existência de um quadro de referência incidindo sobre a adesão geral dos membros do grupo, os mitos não visam, de modo algum, equilibrar ou estabilizar a sociedade, mas constituem uma linguagem que serve para exprimir os direitos, os estatutos contrapostos e rivais. (DETIENNE, 1987, p. 60) O filólogo Detienne parte de uma idéia muito mais antropológica sobre a questão mítica. Já o helenista Jean Pierre Vernant vai mais fundo nas análises míticas. Embora se encontrem características antropológicas em suas indagações, para ele o mito não é determinado nem induzido apenas por organizações sociais; a necessidade do mito vem da própria psique humana individual e principalmente coletiva na hora de colocar em prática um ritual. O homem antigo assim como o de qualquer época histórica possuía a necessidade de entender o que não conseguia explicar através dos estudos, por isso o mental agia diretamente na razão. Em uma das mais brilhantes obras sobre psico-história Mito e pensamento entre os Gregos: estudos se psicologia histórica Jean Pierre Vernant em um dado momento da obra traça um panorama do imaginário religioso através das descobertas arqueológicas de kolossói[20] em partes da Grécia: Quando um homem, que partiu para longe, parece ter desaparecido para sempre, ou quando morreu sem que se tenha podido trazer seu cadáver e nem lhe prestar os ritos funerários, o defunto ou melhor, o seu duplo, a sua psyché fica errando sem fim entre o mundo dos vivos e o dos mortos (...) Substituído ao cadáver no fundo da tumba, o kolóssos não visa reproduzir os traços do defunto, dar a ilusão de sua aparência física. Não é a imagem do morto que ele encarna e fixa na pedra, é a sua vida no além, esta vida que se opõe à dos vivos, como o mundo da noite ao mundo da luz. (VERNANT, 1990, p. 385) O imaginário religioso acompanha a mentalidade grega, pois o kolóssos torna-se uma forma de representação do humano para que este possa ter uma chance de atingir o Elíseos[21]. Este fato conclui a evidência da temência humana sobre o divino, um fato que se encontra arraigado na mente humana até os tempos contemporâneos. Finley não se atenta para nenhuma destas discussões. CONCLUSÃO. SERÁ...?: Embora Moses Finley trate de questões como a religiosa somente como parte da complexa estrutura do mundo antigo, alguns teóricos marxistas erroneamente analisam que Finley coloca o fator econômico como determinante para a estrutura grega antiga, porém não é esta a intenção deste historiador: Podemos decir entonces, que las principales motivaciones no eran económicas sino políticas y sociales, es decir, como dijimos anteriormente lo económico no era un fin, sino un medio para otro fin distinto. (LUCHETTI, 1997, p. 07) Finley se interessa muito mais pelo conhecimento político e social do que somente por um determinismo econômico mesmo que use a economia para estudar o social, esta não é determinante o religioso não se insere no contexto econômico clássico da Grécia estando inserido muito mais na estrutura social. O óbvio seria taxar Finley como um pesquisador da História Econômica, e ele realmente o é tanto é que não fizemos questão de exaltar suas análises econômicas durante o trabalho, já que tanto as análises política quanto a religiosa realizadas por ele partem do campo econômico porém ele não parte deste determinismo. As responsabilidades em se realizar uma análise bibliográfica sobre um autor tão complexo quanto Moses Finley é demasiado grande. Suas linhas de pensamento não partem de um mesmo ponto nem fazem questão de chegar a uma única conclusão. Sua contribuição para o estudo da História Antiga é ampla e no Brasil onde traduções de obras de helenistas e estudiosos da antiguidade são demasiadas raras se tem o privilégio de ter obras de grande relevância traduzidas para o português e mesmo para o espanhol deste autor que embora controverso em alguns pontos, é essencial e enriquecedor para os debates históricos.
Posted on: Tue, 30 Jul 2013 12:32:56 +0000

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