Helena Celestino Coisas de maluco Sobrevivência do - TopicsExpress



          

Helena Celestino Coisas de maluco Sobrevivência do “Obamacare” é derrota para os republicanos e uma vitória para os democratas num dia amargo para a política Vitória ou derrota? No primeiro minuto da terça-feira, como num western de Hollywood, o xerife Obama saiu ferido no embate com os artilheiros do Partido Republicano. Ninguém acreditava que o tiro seria disparado mas, já sabemos, a longa batalha em torno do Orçamento não teve final feliz: derrotado e sem autorização para pagar a máquina administrativa, o governo Obama fechou, abatido pelos radicais do Tea Party. Qual foi a vitória? A partir de ontem, milhões de americanos já podiam se inscrever nos planos de saúde, mais baratos e subsidiados pelo Estado, previstos na reforma-símbolo dos anos Obama. Alvo de uma campanha de sabotagem considerada irracional, maluca, cínica e ridícula até por conservadores esclarecidos, a sobrevivência do “Obamacare” é uma derrota para o Partido Republicano e uma vitória para os democratas num dia amargo para a política. Cinquenta milhões de americanos não têm acesso ao sistema de saúde. Famílias vão à falência porque alguém vai parar na emergência de um hospital público e não têm como pagar a conta, invariavelmente mandada mais tarde. Votado em 2010, reconfirmado pela Suprema Corte em 2012 e salvo pela reeleição de Obama, o Affordable Care Act, uma espécie de saúde para todos, seria muito bem recebido pelos políticos da União Europeia, às voltas com a redução do Estado de Bem-Estar Social. Para padrões europeus - e mesmo brasileiros - o Obamacare é uma interferência modesta do Estado na economia e na vida das pessoas: obriga todos os americanos a se inscreverem num plano de saúde até março de 2014 - sob pena de multas, se não aderirem -, exige das empresas a aceitação de velhos e doentes, garante ajuda aos mais pobres para pagar as mensalidades. Pelas contas do governo, a despesa não seria imensa pois a adesão em massa aos seguros criaria concorrência entre as empresas, e os preços cairiam. A prevenção reduziria também gastos hospitalares. Parece bom, não? Só 40% da população concordam, 17% não sabem ainda e 47% são contra- incluídos aí os sem seguro, teoricamente os mais interessados. Por trás da rejeição, uma briga ideológica sobre o papel do Estado: a direita aferra-se à velha narrativa do sonho americano, um país de oportunidade para todos, em que o indivíduo é responsável pelo seu destino, sem interferência do governo. Obama desafia este mito de que todos vencem no capitalismo americano e não precisam do Estado, ao botar em prática o princípio quase universal de que jovens e bem-sucedidos podem pagar um pouco mais para cobrir os gastos de saúde dos mais pobres e doentes. Os radicais republicanos optaram pela vingança política, ao não conseguirem fazer Obama adiar a reforma da saúde em troca da aprovação do Orçamento. Este filme já foi visto há 17 anos quando os republicanos impingiram a mesma derrota ao então presidente Bill Clinton e amargaram uma brutal rejeição dos eleitores. Eles enlouqueceram, repetiram ao longo do dia analistas políticos e econômicos na Europa. A campanha contra o esboço de Estado solidário que Obama tenta botar em prática nos Estados Unidos é exatamente oposta a enfrentada pelos governos europeus, obrigados pela crise a desmontar a proteção social longamente desfrutada no velho continente. Acossada pela recessão econômica, a próspera e calvinista Holanda foi obrigada a quebrar um dogma respeitado pela elite política desde o fim da Segunda Guerra: o governo de centro-esquerda holandês, tradicional aliado de Berlim e Bruxelas na imposição de medidas de austeridade no continente, anunciou que o clássico Estado de Bem-Estar Social da segunda metade do século XX tornou-se insustentável e será substituído por uma sociedade participativa. Na prática, anunciou cortes nos gastos sociais, sempre mais ou menos os mesmos: fim da ajuda às famílias com filhos pequenos, redução na assistência a doentes crônicos e dependentes, assim como nos programas de assistência social e reinserção dos desempregados no mercado de trabalho. Mas palavras contam. Foi com contorcionismos de linguagem que o Partido Conservador da Inglaterra anunciou na segunda-feira que os desempregados de longa duração serão obrigados a fazer trabalho social se quiserem continuar a receber salário do Estado. E, na França, um tabu está para ser quebrado em nome da eficiência econômica: as lojas em Paris devem passar a abrir aos domingos, pondo fim ao sacrossanto repouso de domingo estabelecido pelas leis trabalhistas há mais de um século. O ano político no Hemisfério Norte começou com som e fúria.
Posted on: Wed, 02 Oct 2013 20:09:43 +0000

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