MODA É CULTURA? Curiosa a maneira como emergiu a discussão - TopicsExpress



          

MODA É CULTURA? Curiosa a maneira como emergiu a discussão sobre o empenho de verbas do Ministério da Cultura na promoção de desfiles de moda em Paris. O “povo da moda” achou o máximo o ato quase intempestivo da ministra Marta Suplicy. Já o “povo da cultura” se sentiu lesado: a Lei Rouanet não é mais a mesma; foi violentada. Outras pressões do genero rondam a Lei Rouanet: a gastronomia, por exemplo, reivindica o emprenho do Estado em sua promoção, especialmente internacional. Trata-se de uma lei marota, que cria a ilusão de que os recursos públicos não são públicos, mas das empresas que arbitram para quem dar a renúncia fiscal do Estado em benefício de uma ideia de cultura pactuada entre Estado e empresas. No meu “Os federais da cultura” (São Paulo, Biruta, 2003) procurei mostrar como esta lei promoveu um mecanismo perverso no campo cultural, criando verdadeiras “castas” de produtores culturais num terreno onde, antes, a competição por recursos escassos era mais simples, pois dependia de menos mediações do mercado. Me parece que, agora, o que está em discussão é outra coisa, por trás da chiadeira do povo da cultura que, obviamente, percebe que pode ser afetado pelo nascimento de um novo competidor pelos mesmos recursos escassos. O que está em questão, porem, é o próprio conceito de cultura. De um lado, o que o Estado entroniza como cultura; de outro, a demanda da sociedade por uma “culturalização” de práticas antes vistas como meramente comerciais. O Estado é mesmo arcaico na sua concepção de cultura. Basta ler a Constituição, as leis setoriais, para perceber que ele ainda privilegia uma visão folclorizada da cultura a par com a proteção a indústrias com forte presença no mercado (cinematográfica, fonográfica, etc). Nas grandes cidades, onde há uma estrutura social mais complexa, essa visão já não abarca o grosso do que as pessoas entendem por “cultura”. Basta acompanhar a importância que tem a programação cultural do Sesc-SP para perceber que nem tudo que a instituição chama de “cultura” se enquadra nos rígidos moldes do figurino do governo federal ou estadual. Há um transbordamento claro, alem daqueles manifestações “autonomas”, que ocorrem sem financiamento público e que revelam um dinamismo bastante interessante. Não se pode mesmo imaginar que a “industria cultural” se modernize, a par com a modernização dos meios de comunicação, sem que o Estado se adapte a ela. Que esteja disposto a “assimilar” a moda ou a gastronomia é uma resposta a este desafio, pois é claro que precisa redefinir seus contornos. Mesmo assim, terá que administrar, com exclusividade, o conflito de repartição dos recursos escassos. Se os recursos aplicados na moda forem do Ministério da Indústria e Comércio, provavelmente não haverá chiadeira. Cada coisa estará no seu escaninho. Talvez chiem outros setores, não o povo da cultura. Alguém, legitimamente, poderia dizer que esse é também o caso da indústria cinematográfica. Será que ela não estará melhor aninhada nos cofres públicos se for considerada uma “indústria”? A modernização da concepção pública de cultura precisa mesmo um debate, um engajamento da intelectualidade (e não só daquela com interesse direto nas atividades culturais financiadas). Que a “ousadia” da ministra desencadei esse debate é o que de melhor podemos esperar.
Posted on: Fri, 23 Aug 2013 04:27:56 +0000

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