Milagre - Milagre Médico Acidente de carro, pós-desastre. As - TopicsExpress



          

Milagre - Milagre Médico Acidente de carro, pós-desastre. As ambulâncias chegam, as sirenes vermelhas clamam urgência. É situação superior, caso de vida ou morte. Um dos tripulantes do veículo epiléptico é levado para dentro da ambulância, um médico lhe chega, acompanhado de um enfermeiro. - Aqui está o que averiguamos. O enfermeiro mostra o prontuário médico, as radiografias, resume a situação, e perquiri: - Quais são as chances dele? O médico examina o paciente, arquiteta o diagnóstico, e dá seu parecer profissional: - Fraturou a medula espinhal, sua respiração é irregular, lhe falta alento, a traqueia também foi danificada, o que resultará em possíveis paraplegia e incapacitação vocal. Taquicardia, taquipneia, diminuição da pressão do pulso, vasoconstrição cutânea, muscular e vísceral, rompimento dos vasos sanguíneos: está com hemorragia interna e aproxima-se de um choque hipovolêmico. Lesões menores nas falanges, carpos e metacarpos, fragmentação da ulna e do rádio, quebra do úmero, rupturas na fíbula e na patela e traumatismo craniano. Teve isquémia quase letal, mais alguns minutos e teria sofrido um edema. Seu organismo pode entrar em falência a qualquer momento, seguido de coma profundo e por fim a morte. - Ele viverá? O médico olha bem para o enfermeiro, estuda seu inquérito, forma seu prognóstico: - Há sempre uma chance. O que ele precisa agora é de repouso e cuidados. No entanto, em uma situação dessas, apenas uma coisa ainda pode interceder a favor dele: a vontade de viver. Se ele tiver ela, conseguirá se curar, embora seu corpo físico o limite a muitas coisas posteriores. - Ele precisa de uma esperança... O enfermeiro desce do veículo, aproxima-se dos policiais: - Havia mais alguém envolvido? - Parece que sim. Havia mais dois corpos, ambos femininos, um no banco da frente e um no detrás. Segundo consta nos documentos que achamos, eram uma família, pai, mãe, filha. - Alguma chance de que essas duas últimas estejam vivas? - Se houvesse qualquer chance, há muito elas já estariam em um hospital, e não indo para um necrotério. O enfermeiro entra novamente na ambulância. - Ele era casado, perdeu a esposa e a filha. Os óculos do médico brilham à luz pálida da lâmpada: - Então só o que resta é esperar que ele sobreviva acreditando que elas estão bem... E que tudo não tenha passado de um sonho - ou pesadelo. - E se ele acordar? O médico dá mais um olhar para o enfermeiro, pesquisa a constatação do óbvio. - Ele não acordará. Estará morto em algumas horas, se muito. Não há aparato tecnológico dentro da nossa medicina que salve alguém nesse estado. - Mas o senhor é o médico, tem de fazer alguma coisa! - E fiz. Estabilizei o pulso, preparei o corpo da melhor maneira que foi possível. Mas apenas o toque divino pode salvá-lo agora. O médico retira-se. O enfermeiro dá um último olhar à vítima, e sai da ambulância. Os faróis são ligados, as sirenes se intensificam, o veículo corre em direção ao hospital. Nas visões do paciente, tudo é tão vago quanto nítido. De alguma forma, ele tem consciência do que lhe aconteceu, mesmo que não consiga abrir os olhos. Ele sabe onde está, mesmo que não consiga sentir seu corpo. As questões vem e vão. O que será que aconteceu com sua esposa e sua filha? O que aconteceu com ele? O que acontecerá com ele? Será que vai valer a pena voltar ao mundo terreno em um corpo alquebrado e em uma vida arruinada? Não seria muito mais fácil abandonar tudo? Um voz lhe responde: - Você tem de viver. - Mas por quê? O que ainda me resta? - Resta tudo que acontecerá ou poderá acontecer. Você não tinha sonhos? Não tinha esperanças? - Mas tudo isso se foi. Tudo morreu. Assim como eu. - Você ainda não está morto. E é por isso que estou aqui. Pois quero lhe fazer uma pergunta: você quer viver, ou quer morrer? A escolha é sua. Só pense antes de fazê-la. E ele pensa. Sua lógica fria isola os fatos, desfragmenta-os, prepará-os para a análise. Ele vê sua vida inteira, seu nascimento, sua infância, sua adolescência, sua maturidade. E também vê sua morte. O que resta na morte? O descanso, a paz que ele tanto aspira. O que resta na vida? Esse é o ponto de interrogação. Essa é a questão que, se não respondida com ponderância, lhe custará a existência terrena. Por que viver? Por quê continuar essa existência? Mas então ele muda o raciocínio: por que não viver? Ele ainda tem tanto a ver, tantos anseios e ambições, tantas lições a dar e receber. Uma fagulha se acende. É o começo. E, se esse pensamento deu certo, por que não mudar a linha novamente? O que ele não quer ver? O mundo? As causas das consequências? A argumentação vem: é para isso que existe o mundo, para gerar causas e consequências. O tempo cuidará de absorver e assimilar essas consequências. E tudo que virá em seguida serão as consequências dessas consequências, nem sempre ruins, nem sempre boas. Um brilho traça seus contornos de luz e sombras. Está na metade. Mas e toda sua bagagem existencial? E sua família que ele não sabe se está bem ou mal? E sua própria vida após essa morte? No entanto, um sussuro lhe chega: se ele viver, ele aprenderá. E aprendendo ele vai evoluir. E evoluindo ele encontrará tudo que procura: encontrará sua cura física, encontrará sua cura mental. Contemplará a paz. E tudo dependerá apenas dele. O fogo cintíla, marca o final, o conhecimento que levará à sabedoria. É hora da escolha. - Está pronto? Tem certeza? Há mais algo a se questionar? - Ainda há muito. Mas nada disso eu chegarei a me perguntar se eu não escolher. - E o que você escolhe? Vida, ou morte? - Eu escolho a vida. Escolho sobreviver, escolho viver. Eu quero viver, desejo isso, almejo isso. Preciso disso. Quero a vida, a tristeza e a alegria, quero o aprendizado, quero sentir, quero ver, quero poder ensinar e poder existir. Ele sente um sorriso. - Ele abriu os olhos! Ele quer viver! - expressa alegre o enfermeiro. O médico corre até o paciente, aturdido, impressionado com a força daquele sujeito. E sorri em seu íntimo por essa pequena vitória da humanidade. - Então, meu caro, isso quer dizer apenas uma coisa: que os sinais foram mostrados, que as sementes foram plantadas. Que ele acredita na vida, mesmo que não a compreenda. - Mas você disse que não era possível ele viver pela nossa medicina. - Talvez não pela nossa... Mas, quem sabe, pela de outros? Em seu olhar arde a centelha da felicidade: - E isso, meu amigo, é o que chamamos de operar um milagre. Iniciado 2 de Setembro de 2013, por volta das 2:30 Terminado em 2 de Setembro de 2013, por volta das 5:20
Posted on: Tue, 17 Sep 2013 05:21:47 +0000

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