No rastro das denúncias de espionagem realizadas pelos Estados - TopicsExpress



          

No rastro das denúncias de espionagem realizadas pelos Estados Unidos contra diversas nações, inclusive o Brasil, e que, de certa forma, abalaram a confiança no mundo virtual, o País está prestes a criar o seu Marco Civil da Internet, uma espécie de constituição virtual que norteará as relações entre os diversos atores da web. Questões como interesses econômicos, privacidade e o estabelecimento de deveres e direitos estão contempladas no projeto que começou a ser formulado em 2009, ocasião em que o então ministro da Justiça, Tarso Genro, abriu consulta pública para que todos pudessem se manifestar a respeito do assunto. Com o novo marco, o usuário terá mais segurança em relação à privacidade FOTO: FABIANE DE PAULA No dia 11 de setembro, o projeto entrou em regime de urgência a pedido da presidente Dilma Rousseff, logo após as denúncias de espionagem das suas comunicações eletrônicas e telefônicas bem como da presidência da Petrobras feitas pela agência americana de segurança. O Diário do Nordeste ouviu especialistas sobre o assunto para saber deles o que muda a partir da aprovação do projeto. Já vem tarde Não há a menor dúvida que o marco é necessário e já vem tarde. O Brasil precisa de uma regulação para estabelecer responsabilidades, o que pode ou não ser feito na internet, aponta Luís Fernando Moncau, pesquisador do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (FGV Direito Rio). O pesquisador, que acompanhou de perto a formulação da proposta, garante que questões como conteúdos pessoais e liberdade de expressão, dentre outras, foram debatidas ao longo desse tempo. O projeto, como concebido, após consulta pública à sociedade, foi elogiado não somente no Brasil mas por parte da comunidade acadêmica internacional que estuda o assunto. E olha que suscitou comentários lisonjeiros, do tipo, ´olhem o que o Brasil está fazendo´, ressaltando a nossa iniciativa. Luís Fernando Moncau, no entanto, teme que a proposta original sofra grandes alterações no Parlamento. Sabemos que há um lobby muito grande no Congresso para mudar certas cláusulas. Não sei se, após a votação final, com a aprovação de algumas emendas, o projeto, que hoje é um exemplo, vai se transformar em algo não tão elogiável. Para o pesquisador, um dos temas mais polêmicos é o da chamada neutralidade de rede que, em linhas gerais, impede que haja a discriminação entre usuários. Por exemplo, não se pode diminuir a velocidade de acesso dos que baixam muitos vídeos nem haver censura a conteúdos. Provedores de conexão, empresas de telefonia ou a cabo ficam proibidos de discriminar as conexões com base no que estamos utilizando. Não se pode, por exemplo, aumentar a velocidade de um serviço em detrimento de outro. Sabemos que as teles são contra pois querem cobrar preços diferenciados, conta o especialista Luís Fernando Moncau. No que diz respeito à atuação do Estado, Luís Fernando lembra que, há algum tempo, a maioria dos internautas acreditava que o melhor era o Estado não se intrometer nas relações do mundo virtual. Acredito que 90% dos usuários hoje pensam diferente diante de muita coisa que aconteceu em relação à invasão de privacidade, prevalência dos interesses econômicos etc. É preciso que o Estado exerça o seu papel de fiscalizador. É bem verdade que devemos ficar atentos para evitar os excessos, conforme ocorreu com os Estados Unidos no recente escândalo de espionagem. Ritmos diferentes O professor Jamil Marques, do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Ceará (UFC), também acredita que não é possível mais continuarmos a usar a ferramenta da internet sem uma regulamentação. Precisamos definir os papéis dos três entes principais do mundo virtual: do usuário, o das empresas e o do Estado. Antes de mais nada, temos que entender que nem sempre tecnologia e legislação andam no mesmo ritmo. Para Jamil, a utilização da internet tornou-se algo desregrado. Hoje, quem se acha prejudicado recorre à Justiça e, nem sempre, o caso é julgado. Como faz questão de lembrar o professor, no Japão tentou-se controlar a campanha eleitoral antecipada na web, multando os provedores de internet. Só que, para driblar essa ação do Estado, os políticos recorreram a provedores de outros países. Vejo a criação do marco como uma tentativa de estabelecer algum tipo de barreira visando disciplinar a utilização de tecnologias. A questão maior é saber como o Estado, as empresas e os usuários vão chegar a uma regulamentação que contente a todos. Privacidade Outra questão colocada pelo professor da UFC diz respeito à privacidade. Ele enfatiza que, mesmo sem perceber, a cada dia novos aplicativos mexem com a nossa individualidade. Quando o bina surgiu, foi possível identificarmos de onde vinha a ligação telefônica. A tecnologia modificou a nossa relação com o tempo, o espaço e com as outras pessoas. É necessário saber até que ponto o estado pode interferir nas relações virtuais, qual o limite dessa interferência. Nesse sentido, creio que o marco civil deve proteger o usuário dos excessos e impedir que o governo caia na tentação de poder agir livremente, sem limites. Necessidade O professor de Marketing da Universidade de Fortaleza (Unifor), W. Gabriel Oliveira entende que o marco é uma necessidade não só do Brasil mas dos demais países. Precisamos aprová-lo rapidamente. Houve uma grande discussão em torno do assunto. Caso ele não atenda a todas as necessidades, poderemos ajustá-lo com o tempo, já que a tecnologia avança a galope. Aplicativos surgem a todo instante. Gabriel frisa que uma das grandes preocupações é no tocante ao compartilhamento de dados, inclusive os pessoais. Isso tem que ficar devidamente regulamentado. O Facebook, por exemplo, encontra-se em 95% dos países. Nossas informações pessoais estão lá dentro. Necessitamos de uma legislação que os proteja. Icann espera por legislação brasileira A Corporação da Internet para Atribuição de Nomes e Números (Icann, na sigla em inglês), autoridade responsável pela coordenação mundial da rede, aguarda pela aprovação da legislação brasileira com expectativa e vê nela a possibilidade de tornar-se exemplo para as demais nações. Conforme o vice-presidente da Icann para a América Latina e o Caribe, Rodrigo de la Parra, a importância brasileira no novo modelo de gestão mundial da internet ganhou importância após o discurso da presidente Dilma na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas. O discurso feito pela presidenta Dilma foi muito bom. Queremos evitar posições extremas, centralizadoras, como as adotadas pela Rússia, Síria ou China, ou, no outro extremo, posições extremamente liberais que não preveem formas de regulamentação ou de promoção, destacou Parra. A Icann tem se manifestado favorável a um modelo mais democrático de gestão da internet, com a participação de todos os governos e de todos os atores da rede mundial de computadores. Para avançar nessas discussões, Parra avalia que será fundamental o papel da conferência mundial sobre governança da internet, prevista para abril de 2014 no Rio de Janeiro. A tendência, segundo ele, é que nessa nova forma de gestão haja a participação de muitos stakeholder (partes interessadas). Dessa forma, o Brasil tem muito a colaborar, até por ter um modelo similar interno: o Comitê Gestor da Internet (CGI), que é um modelo com multiatores, prática que é boa e pode ajudar o resto do mundo, acrescentou. O comitê é o órgão responsável por coordenar e integrar todas as iniciativas de serviços de internet no Brasil. Formado por representantes da sociedade civil e por membros do governo, o grupo participa de debates e deliberações sobre implantação, administração e uso da rede.
Posted on: Sun, 03 Nov 2013 11:10:05 +0000

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