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Norma Bengell colaborou como autora no livro 68 a geração que queria mudar o mundo relatos, organizado por Eliete Ferrer e publicado pela Comissão de Anistia do Min. da Justiça. Fragmentos Norma Bengell Tudo começou com a proibição de uma peça de teatro - Cordélia Brasil. Nós, da classe teatral, fomos para o Municipal e fizemos até uma passeata com todos os intelectuais, Flávio Rangel, Antônio Callado, Mário Pedrosa e muitos outros. Foi o meu espírito libertário que me fez participar de 1968. Eu estava no auge da minha carreira na Itália, mas não pude deixar o Brasil. Cedi à minha consciência, fiquei e fiz a peça Cordélia Brasil com o Oduvaldo Vianna Filho. A partir daí, fui ficando... e reclamando. Quando mataram o Edson Luiz, fui para a Assembleia Legislativa. O Sérgio Grillo disse que eu tinha que falar e me colocou sobre o parapeito da escadaria. Quando eu vi aquele mundaréu de gente, coloquei as mãos no rosto e comecei a chorar. Lembrei-me da imagem do Edson ali, no chão, morto. Com um grito de desespero feminino, levantei a mão para o alto, de punho cerrado, e gritei: - RECUSO-ME A TER FILHOS PARA SEREM ASSASSINADOS PELA DITADURA! - Essa foto saiu na primeira página do O Globo. Aí começou a perseguição - invasão da minha casa, assédio no teatro, até bombas de gás dentro do teatro jogaram. Com isso eu fiquei cada vez mais revoltada e não parei. O desempenho repressivo dos esbirros do governo militar primava pelo ridículo. Por exemplo, um “cana” do DOPS ia todos os dias ao teatro assistir Cordélia Brasil. Em uma das vezes em que fui presa, ele estava lá, no DOPS, e disse: ― Quer ver? Eu sei o texto da Cordélia todinho de cor. E sabia mesmo, principalmente um monólogo meu que dizia: ― Vou fazer desta casa um bordel, porque eu quero ser uma putona. Cordélia foi proibida concomitantemente com uma peça do Plínio Marcos e outra do Nelson Rodrigues. Eu consegui uma audiência com o então ministro da justiça, Gama e Silva. Acho que era esse. Ele olhou para o Plínio que, encarando-o, cuspiu no tapete do homem. O diplomata que estava conosco disse, muito sem graça: ― Ele é o homem zangado do nosso teatro. - O ministro acabou liberando as peças e falou: ― Ah, quando estou cansado vou ver filmes brasileiros. Durmo, como aconteceu no Cara a Cara, do Bressane. Quando acordo, proíbo. De outra feita, um coronel que me interrogou no primeiro batalhão da PE, na Rua Barão de Mesquita, queria saber onde estava o ouro de Moscou... Fui presa várias vezes e, por fim, fui sequestrada em São Paulo e levada para o Rio. Para o exército. Só reconheci que era o Rio porque eu vi o Maracanã. Fui interrogada por um coronel do então Ministério da Guerra. Ele queria saber quem era de esquerda na classe artística. Eu o fixava e dizia que não sabia, pois nós não pedíamos atestado de ideias políticas. Fui interrogada durante 48 horas. O telefone não parava. Chegou uma hora em que o coronel disse que eu iria voltar para São Paulo. Acompanhou-me até o aeroporto. Eu não tinha nem bolsa, pois quando fui sequestrada joguei a bolsa fora. O que motivou meu sequestro foi o fato de eu ter descoberto que as concessões de todas as lojas do Galeão haviam sido negociadas com uma firma americana, Marin Company, se não me falha a memória. Só não negociaram a pista, é claro. Desde então, não tive mais descanso ― perseguições, invasão, prisão, conhecia muitos amigos que se foram e outros que foram torturados. Isso me dava forças para continuar na luta. Tornei-me simpatizante da ALN. Ajudei muitas pessoas que queriam sair do Brasil. Saí eu mesma do país depois que a Sônia Nercessian foi presa e barbaramente torturada. Foi uma coisa terrível e ela, com o bom caráter que tinha, não delatou ninguém. Perdeu trinta quilos na prisão. Eu, então, fui para o exílio. Morei em Paris e era muito famosa lá. Continuei, durante os anos de exílio, a criticar a ditadura. Depois que chamei o Médici de urubu-rei, no L’Express, em uma entrevista para o Eduardo Balbi, tiraram o meu passaporte. Essa edição foi retirada das bancas e só leu quem a recebeu em casa. Texto extraído da página 419 do livro 68 a geração que queria mudar o mundo relatos organizado por Eliete Ferrer e publicado pela Comissão de Anistia do Min. da Justiça. Para ler ou gravar o livro em PDF, abra esta página na Internet: portal.mj.gov.br/services/DocumentManagement/FileDownload.EZTSvc.asp?DocumentID={C41C82BE-5C68-48B1-B36B-0F3AC3F94232}&ServiceInstUID={59D015FA-30D3-48EE-B124-02A314CB7999}
Posted on: Thu, 10 Oct 2013 03:12:13 +0000

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