O Autarca – Jornal Independente, Quarta-feira – 09/10/13, - TopicsExpress



          

O Autarca – Jornal Independente, Quarta-feira – 09/10/13, Edição nº 2636 – Página 4/4 Coluna Cultura e Sociedade de Johnny Kraveirinya Culture & Society _________________________________ Desporto: Heranças Portuguesas em Moçambique (1/3) Em 7 de Março de 2003 escrevi esta crónica em Maputo, e aí publicada em três partes. Na realidade, o passado é um currículo que através do presente nos aponta o futuro numa dimensão inatingível, anteriormente. Chegados ao futuro sopesamos o que foi esse passado. E assim passa a glória do mundo quando (todos) fecharmos os olhos de vez, deixando as vaidades fátuas e vãs – porém, outros se esvaem espumando ódios a esmo e sem glória, num masoquismo eterno. ‘GLORIA TRANSIT MUNDI’ diziam os latinos (mas os verdadeiros… da antiga Roma). Pois, estamos todos de passagem! ______________________________________________________ QUO VADIS DESPORTIVO | E PLURIBUS UNUM ---------------------------------------------------------------------------- PARTE 01 de 03 Para onde vais Desportivo? Sim, Quo Vadis Grupo Desportivo de Maputo (GDM)? A actual direcção, do GDM, é herdeira de uma herança muito pesada de tradição de nobreza desportiva e humanista! Será que tem cumprido com essa tradição? Que motivos (nos) levam a levantar esta questão? Talvez um pequeno historial deste antigo Clube de Moçambique – nos ajude a reflectir sobre estas questões... …Antes de 1921, um grupo de colonos portugueses funda o grupo desportivo “ÁGUIAS NEGRAS” que daria a origem ao Grupo Desportivo de Lourenço Marques (GDLM). Alguns desses colonos, eventualmente, pertenceriam à franco-maçonaria portuguesa. E PLURIBUS UNUM E Pluribus Unum (Todos por um, Um por todos) é uma sigla maçónica e seria a do GDLM, a mesma do Sport Lisboa e Benfica (SLB). Apesar de benfiquistas em Portugal, os dirigentes do Desportivo (1959/60), recusam-se a serem filiais do SLB – Benfica. Era o embrião do nacionalismo ‘branco’ moçambicano. Com apoio da CMLM (Câmara Municipal de Lourenço Marques), os dissidentes do GDLM, eivados de fervor patriótico lusitano, fundam o Benfica na Costa do Sol. Viria a ser a 1ª filial do SLB na capital. Mais tarde, o clube preferido dos elementos da PIDE – polícia política (portuguesa). Recuando no tempo, um dos primeiros grandes beneméritos do GDLM, seria o pioneiro colonial Paulino Santos Gil (nome dado ao campo de futebol). Mais tarde outro colono, também benemérito, o português Custódio da Graça, carinhosamente chamado de papá Graça, pela massa associativa e para além dela. Esse carinho adveio da sua desmedida preocupação para com o clube e em particular para com os atletas de todas as cores e origens, praticantes das inúmeras modalidades. O Desportivo era por excelência, em Lourenço Marques, dos clubes da baixa (dos ‘brancos’), dois dos (clubes) mais populares nos subúrbios de esmagadora maioria ‘negra’ e mestiça. Essa popularidade vinha da particularidade (apesar da época), de ser o clube menos racista. No Desportivo, não havia racismo na prática desportiva. Essa tradição, somente era superada pelo 1º de Maio, clube de operários e de anarco-sindicalistas, desterrados da metrópole colonial, Portugal. Foi no 1º de Maio que os primeiros atletas ‘negros’ e mestiços jogaram em clubes de ‘brancos’ da baixa laurentina. O 1º de Maio é fundado em 1 de Maio de 1917 e o Desportivo em 1921. O primeiro nome do 1º de Maio foi ‘Os Vermelhos’. Mais tarde, tiveram de mudar de nome, por razões políticas. Nos subúrbios, a AFA – Associação de Futebol Africana – dirigia os destinos dos ‘negros’ e mestiços. O governo colonial controlava de perto. Era o apartheid à portuguesa. (Continua). JK | Texto 1/3, de 7 de Março de 2003. CRÓNICA Quo Vadis Desportivo - fOTO: Desportivo da década de 1940. O segundo a contar da esquerda, de pé, é Jorge Nicolau tio materno de Stélio Craveirinha. Agachado ao centro Mário Wilson. (Parte 1 de 3) O Autarca – Jornal Independente, Quarta-feira – 16/10/13, Edição nº 2641 – Página 4/5 QUO VADIS DESPORTIVO: PARTES 2 E 3. Capítulos 2 / 3 | continuação da reedição de 09/10/13. E PLURIBUS UNUM Heranças Portuguesas em Moçambique Em 7 de Março de 2003 escrevi esta crónica em Maputo, e aí foi publicada em três partes. Em cada distrito colonial de Moçambique (hoje províncias) existiam clubes desportivos afiliados ou simpatizantes do Grupo Desportivo de Lourenço Marques ou – Grupo Desportivo LM (à inglesa). Grupo Desportivo de Lourenço Marques | Grupo Desportivo de Maputo Para os mais desatentos da semântica da língua portuguesa – “DE” é preposição de procedência. Neste contexto, por haver vários grupos desportivos desses locais, como o de Lourenço Marques (ou Maputo) e por aí afora, ainda que, com outras denominações, de sul a norte de Moçambique. Estes textos (1 a 3) têm 10 anos, 7 meses e algo. JK 2013. __________________________________________________ E PLURIBUS UNUM Apesar de mais tolerantes, tanto no 1º de Maio como no Desportivo, os seus corpos sociais seriam compostos somente por ‘brancos.’ Cabo-verdianos seriam a excepção. Temos o caso do advogado cabo-verdiano, António de Sousa Neves, ter sido dirigente do GDLM, de 1944 a 1951. Este advogado era opositor ao regime de Salazar e foi desterrado para Moçambique. De 1955 a 1957 outro exilado político português, o advogado Fernando Olavo Gouveia da Veiga, foi presidente do Desportivo. A nível de admissão de atletas não havia racismo. No entanto existia um certo elitismo no Desportivo. Nos inícios dos anos 1960, recordamo-nos do caso de Eusébio da Mafalala (pai mestiço angolano de Malange e mãe ‘negra’ ronga), ter sido impedido pelo porteiro português, de entrar no Desportivo, seu clube de eleição. O vizinho Sporting (em ‘abertura racial,’ ganhou com a rejeição). Ambasse do Chamanculo (pais mestiços maometanos) é outro exemplo. Foi para o Ferroviário, clube oficial dos CFM, por necessidade de emprego após rejeitado no Desportivo de LM. Ambos jogavam com mais empenho “contra” o seu... (LEIA E DIVULGUE O AUTARCA. O SEU DIÁRIO ELECTRÓNICO EDITADO NA BEIRA) O Autarca – Jornal Independente, Quarta-feira – 16/10/13, Edição nº 2641 – Página 5/5 | Desportivo, para mostrarem o que valiam e o que este perdera. Pelo contrário, os Sportingues de Moçambique primavam pela discriminação racial, em todo o território. Era mesmo “for whites only.” Os Sportingues eram por excelência os clubes da PSP – Polícia de Segurança Pública. Em finais de 1950, inícios de 1960, seriam admitidos os primeiros atletas não ‘brancos,’ como o caso de Hilário da Conceição (pai ‘branco,’ mãe ‘negra’). Nos clubes desportivos dos goeses ou indo-portugueses, os ‘negros’ e mestiços, podiam praticar futebol mas não podiam participar nas festas e bailes do clube. O mesmo se aplicava no clube dos mestiços, o Atlético Nacional, em relação aos ‘negros’ assimilados, nos anos 1940 / 50. Nos clubes de indianos e chineses, nem isso. Só entre eles. Era o apartheid à portuguesa. Esta introdução serve para dizer que o Grupo Desportivo (de) Maputo, ora em questão, herdou uma herança de muita responsabilidade. Tradição que vem de muito longe – um Clube de Vanguarda – dirigido por pessoas com visão e ideal desportivo de solidariedade, conduzindo atletas com respeito, dignidade. O resultado eram os bons níveis alcançados. O Desportivo era dirigido por intelectuais portugueses da oposição democrática a Salazar. Mais tarde, nacionalistas africanos da clandestinidade passariam pelo Desportivo, como o poeta José Craveirinha. Os dirigentes do Desportivo, tradicionalmente, sempre se pautaram por respeitar os seus atletas, mesmo quando os sancionavam disciplinarmente, pois no fundo se orgulhavam pelas «performances» de alto nível de seus atletas. As punições eram pedagógicas sendo dada uma nova oportunidade ao atleta. Somente em último caso de prevaricação era este expulso. É também do Desportivo (após a independência de 1975), a única atleta de Moçambique de nível mundial –Maria de Lurdes Mutola, Atleta do Atletismo, não do Futebol. Foi formada no Desportivo pela mão do seu treinador Stélio Craveirinha. (JK 2003 | Continua). Parte 3 e Última: QUO VADIS DESPORTIVO? Muitos dirigentes desportivos não devem saber quanto tempo leva a ser formada uma atleta como uma Lurdes Mutola. Mas é muito mais tempo do que ‘tirar’ uma licenciatura de Direito ou de Economia. Vamos lá... é muito mais tempo do que um mestrado nas respectivas Faculdades, contando com os chumbos e as cunhas para passar de semestre. O treinador Stélio Craveirinha, também não deve saber, por uma razão muito simples – não tem tempo para contabilizar em vários anos o tempo despendido na dedicação às suas atletas. Está ocupado demais na formação (delas), para se preocupar com esses detalhes. Aconteceu isso quando formou a campeã mundial, Lurdes Mutola. Presidentes de Direcção do Desportivo de Maputo, entraram e saíram, quando a Lurdes Mutola estava a ser formada, aliás, formação em arranque final. A única glória do GDM em modalidade desportiva, a nível nacional e internacional, actualmente, é o Atletismo feminino. Não é o futebol ou outra modalidade. O atletismo não beneficia de nenhum apoio decente da direcção do clube. Apesar de ser um desabafo, contra factos não há argumentos! Post Scriptum – Ninguém me passou procuração para escrever esta crónica. Colhi a indignação que anda no ar lançada pelos adeptos do atletismo moçambicano independentemente da cor clubista. A única glória que temos no Desporto em Moçambique a nível mundial é o Atletismo e a nível regional (África), é o Basquetebol, ambos femininos. A Natação também quer espaço para crescer. Me espanto com os meios financeiros disponíveis nos clubes e FMF a dispor dos futebóis, a começar pelo próprio GDM. Até agora não fomos a lado nenhum com o futebol…e gastam-se milhões e mais milhões. A questão do futebol é básica de uma política nacional (?!) para um desporto sem prioridades. Mas este tema...fica para outra altura! JK 2003. Parte 3 e Última: QUO VADIS DESPORTIVO? Update em 2013| O pai do hoquista Fernando Adrião (campeão mundial), o irmão e família, como pioneiros em África, deixaram a herança desportiva de uma modalidade de elite – o hóquei em patins, erguendo o nome de Moçambique desde 1958 em Montreux, na Suíça. Apesar dos pesares iniciais, após 1975, o hóquei em patins moçambicano, sénior, ressurge na Argentina, em San Juan, com renovado vigor, num honroso 4º lugar no campeonato do mundo de 2011, logo atrás de Portugal (3º), Argentina (2º) e a campeã mundial, Espanha (1º). Em 2013 Moçambique, em Angola, ficaria em 7º lugar à frente da França, de Angola e da Suíça, et cetera. Do Olimpo, Fernando Adrião e o pai, lá onde estiverem, com certeza sorriem. Nós os outros, simples paisanos aqui da terra, reconhecidos, aplaudimos. (JK 2013) E PLURIBUS UNUM Quo Vadis Desportivo? Capítulos 2 / 3 | continuação da reedição de 09/10/13. IMAGENS: Nas fotos, da era colonial, duas das maiores glórias (luso) moçambicanas, a nível mundial, do então Desportivo de LM (hoje de Maputo): - Mário Coluna (n. 1935) no futebol – foto à esquerda (todo de branco) e Fernando Adrião (1939-2006) no hóquei em patins. Ambos visionários de uma moçambicanidade em processo (como o guarda-redes Costa Pereira do futebol). Todavia, no novo país independente de 1975, a FreLiMo não os quis valorizar. Perdeu o desporto moçambicano. Esses mesmos atletas de alta competição a nível mundial, acreditaram desde sempre que num futuro Moçambique o desporto seria de excelência, sem complexos de Portugal. Logo o afirmaram e agiram, após o 25 de Abril de 1974. Por outro lado, no mundial de hóquei em patins na Argentina em 1978, F. Adrião era o seleccionador-jogador da selecção de Moçambique e foi barrado de jogar pelo responsável moçambicano da comitiva, no jogo com o Portugal de António Livramento. F. Adrião (ainda em forma) queria despedir-se do hóquei em patins como atleta, com as cores nacionais da selecção de Moçambique. No país, eram os tempos do carapau, repolho com feijão, e chambôco (cassetete), se refilares. A título de curiosidade: quem dinamizou o hóquei em patins em Moçambique, África do Sul e Brasil, foi o pai de Fernando Adrião. Décadas e décadas de uma família dedicada ao desporto em patins a partir de Moçambique. Última foto: nova geração moçambicana – a campeã mundial de Atletismo Lurdes Mutola (1972), também saída do Grupo Desportivo LM e para o mundo, pelas mãos do seu treinador Stélio Craveirinha, recomendado pelo pai José Craveirinha (poeta e desportista). JK 2013. Partes 2 e 3: QUO VADIS DESPORTIVO? E PLURIBUS UNUM O Autarca – Jornal Independente, Quarta-feira – 16/10/13, Edição nº 2641 – Página 4/5
Posted on: Wed, 04 Dec 2013 14:17:35 +0000

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