O mundo faminto das mulheres Compartilhar732 94 Criamos filhos - TopicsExpress



          

O mundo faminto das mulheres Compartilhar732 94 Criamos filhos sem apoio. Vivemos uma vasta solidão, nos perdemos de nós mesmas. E umas das outras. É preciso resgatar a conexão ao nosso mundo feminino e nos apoiarmos mutuamente. Por Ana Kessler 24/set 13:54 Combinei com a Mari Della Barba de escrevermos posts “casados”, cada uma contando da própria experiência, ela falando sobre criar filhos com a ajuda da família e eu, ao contrário, sem auxílio algum. Fui escrever a primeira linha e quase chorei. Estou tão exausta que a falta de retaguarda está pesando uma tonelada sobre meus ombros. Senti pena de mim mesma e quase me peguei no colo para me autoconsolar. Então resolvi que, para não cair no risco deste texto virar um muro das lamentações, vou mudar um pouco o enfoque. E voltar no tempo, numa reflexão sobre como nós, mulheres, dissolvemos sem querer a rede de apoio feminina que sempre tivemos para criarmos nossos filhos e nos isolamos catastroficamente. O que nos levou a este isolamento? Quando foi que nos perdemos de nós mesmas? E umas das outras? Ainda dá tempo de resgatar o costume de nos apoiarmos mutuamente? Desde que o mundo é mundo vivemos em tribos. Fomos civilizando, mas em geral a formação dos clãs permaneceu igual: formada por laços familiares. O que quer dizer que mães, avós, tias, primas, sobrinhas, unidas pelo sangue e muitas vezes morando na mesma casa ou região, teciam juntas seus destinos. Quando nascia uma criança era uma festa, um acontecimento celebrado com dança e riso, mais um fruto que vingava na árvore genealógica daquela família. A mãe era cortejada e cercada de mimos e cumprimentos. O último pensamento que passava pela sua cabeça era “Meu Deus, e agora, como vou criar esse bebê sozinha?”. Ela nunca estava sozinha. Hoje encontramos a vizinha no elevador e sequer sabemos seu nome. Em busca de melhores oportunidades, mudamos de bairro, de cidade, de país. Encontramos os parentes só pelo Skype, isso quando temos tempo para falar com eles nas nossas rotinas corridas. Mães moram longe das filhas, irmãs não convivem mais, primas só no Natal e olhe lá. Avós modernosas querem resgatar a juventude e curtir, viajar, malhar, voltar a estudar, criar netos nem pensar. Não há mais oferta de suporte, nossos umbigos são o centro do mundo e nosso mundo está sem cordões umbilicais. Maternidade se tornou halterofilismo. Sim, conquistamos o mercado de trabalho. Agora temos pró-labore, independência, autonomia. Foi-se a época dos papéis pré-determinados, da mulher bibelô, sem “valor”, incapaz de votar, de opinar, de decidir, de se autogerenciar, de ir e vir. Da dona de casa que não “trabalhava”. Dizimamos esse passado inglório e na explosão nuclear arrasamos junto o lado bom: o exercício da convivência. Quando foi a última vez que você reuniu amigas para um descompromisso regado a gargalhadas? A união com outras mulheres era a nossa força, conhecimentos milenares e ancestrais eram passados de geração para geração. Exatamente o que descartamos. Evoluímos tanto que, de seres gregários, passamos a ermitãs urbanas. Nossa essência feminina da troca de experiências, do conversar para organizar ideias e sentimentos, de acalentarmo-nos minguou. O conhecimento oral tornou-se digital. Teclamos, postamos, estamos cercadas de ausências físicas. Cada vez mais conectadas e sentindo falta de conexão. De toque, olho no olho, sorriso sem Photoshop. Onde habita a nossa força? O que fizemos do nosso poder? Mulher se alimenta na alma. Precisamos de arte e artesanato, de literatura, música, bordar, pintar. Espaço para nos expressarmos. Dançar. Necessitamos do aroma das especiarias, do fascínio dos chás, da combinação de temperos, de elogios. Flores. A natureza e seus elementos foram rechaçados de nossos ciclos: fugimos da chuva, evitamos o pé na grama, temos nojo de terra molhada, nos protegemos do sol. Até o ar, tão nosso amigo para inspirar, sufocamos. Corremos pra lá e pra cá, mal respiramos. Precisamos nos resgatar. Então viramos mães e deixamos nosso mundo interior ainda mais faminto. Como num turno de fábrica, nos revezamos para cuidar dos filhos. Sai marido, entra babá, sai babá, entra sogra, sai sogra, entramos nós. Ou, como no meu caso, atuo 24h. E assim seguimos. Só falta instalar um cartão-ponto na soleira da porta. Onde havia seres humanos agora há eletrodomésticos. Preparamos comidas em um minuto depois de jogar todos os ingredientes no liquidificador. Nosso melhor amigo é o micro-ondas, nossa melhor amiga é a internet. Até quando? Essa é a vida que queremos deixar de herança para os nossos pequenos? Há anos atrás havia um grupo de amigas que se reunia quinzenalmente na minha casa, no Rio, em encontros batizados “Saraus”. Partíamos do princípio que cada uma de nós tinha um talento especial que poderia ser repassado às demais, uma cozinhava bem, a outra era escritora, fazíamos degustação de vinhos, massas caseiras de pizza, montávamos painéis de fotografias, nos escutávamos. Éramos dez e nossos saraus entraram para a história. Até hoje comentamos o quão revigoradas nos sentíamos. Meu lado mãe está desamparado talvez porque eu esteja investindo pouco em mim mesma. Uso a desculpa de que não tenho ajuda para não me ajudar. E se eu simplesmente me priorizar? É hora de pensar com seriedade no assunto. Deixar esta que me tornei virar cinzas. E, feito Fênix, renascer.
Posted on: Wed, 25 Sep 2013 19:33:02 +0000

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