OPINIÃO II À sombra de Caim * A inclinação ao mal pode ser - TopicsExpress



          

OPINIÃO II À sombra de Caim * A inclinação ao mal pode ser corrigida, se o medo original puder ser curado Ruy Borba, filho, advogado e membro da Academia de Letras e Artes Buziana Mesmo que se tenha como alegórica a linguagem dos textos bíblicos, esses têm servido, como arquétipos para a nossa civilização. Caim é um desses modelos, já muito explorado pelo empirismo científico. Ele seria o ‘joio’ manifestado, trazido à superfície da humanidade. Deve se registrar de que os filhos de Eva e Adão não viviam mais num ‘estado de natureza’ * pleno. Aceitando tratar-se de uma alegoria sobre a humanidade, o ‘trigo’ estaria representado pelo seu irmão, Abel. Na cena, o preferido de Deus. Fica claro pelos textos que a violência é parte da natureza humana, podendo-se dizer até que é um fator do dinamismo social, como foram os inumeráveis exemplos históricos da humanidade. A história bíblica não revela com clareza, entretanto, que, na raiz do ato de violência de Caim contra Abel, não foi a inveja, mas o medo, o medo da exclusão, de ser afastado do convívio do amor celestial, de ser-lhe tirada a chance da prosperidade, o seu radical. Portanto, não é a violência que gera violência, como se fora um móbile contínuo, gerando energia própria original. A violência é resultado do medo, do medo de ser-se condenado à invisibilidade social. A literatura mais recente oferece fontes para esse entendimento. ‘Visconde partido ao meio’ * de Ítalo Calvino; e, antes, ‘Dr. Jekill (O Médico) and Mr. Hyde (O Monstro) * de Robert Louis Stevenson descrevem esses traços do bem e do mal, e como esses sentimentos cruzam pelos mesmos ambientes, se sucedendo um pelo outro, e até mantendo, em circunstâncias, um convívio. ‘Crime e Castigo’, a inigualável obra de Fiodor Dostoievski, escreve bem como esses cruzamentos podem ocorrer entre as pessoas mais ordinárias numa anatomia de um crime *. Mas que importância tem essa discussão sobre a origem do mal, e como ele se contrapõe ao bem? Muita. Sobretudo quando se está operando a Justiça, que aplica a norma do Direito, de acordo com o contrato social, que recepciona norma de proteção contra o ‘estado de natureza pura’. Na obra de Stevenson, datada de 1886, e passado na Inglaterra, quando se convivia com um acentuado desnível social, uma pobreza miserável e segregação social, a Justiça e o Direito assumem um protagonismo, além das coxias, já que na Justiça, mesmo que de forma simplificada, o juiz decide o que é certo e o que é errado, ainda que, por vezes, fracasse na busca da ética. O lado bizarro do ser humano balança entre a civilização e barbárie, cujo arbitramento é comissionado à Justiça, que, por sua vez, procura casar com o Direito, e fica frente a frente ao mal, sempre mais nítido e à vista do que o bem, esse que precisa ser buscado, embora esteja lá na sombra, ou permanecer nela, enquanto houver ausência da ética. A inclinação ao mal pode ser corrigida, se na base o medo puder ser curado Na obra de Stevenson, Mr. Hyde (o monstro) é descrito sempre como a essência maligna. Dr. Jekill (o médico), o lado bom, embora mantenha um hábito de confessar-se, como culpado, o que indica serem os dois a mesma pessoa. Os nomes dos personagens - JeKill, sugere aquele que mata; Hyde, o lado escondido - dão a pista de que essa virtude convive com aquela desvirtude. Dr. Jekill, apesar de sua posição na sociedade, é um segregado social, sem relações afetivas, o que abre espaço para o seu lado obscuro, representado pelo Mr. Hyde. No medo também teve a origem dos organismos de segurança coletivo, com a criação de forças e do próprio Estado. Relato de Maquiavel nos ‘Discursos Sobre a Primeira Década de Tito Lívio’, pode-se aprender que no mundo primitivo, habitantes procuravam se agrupar, para se blindarem de ataques e da violência. Novamente, foi o medo, antes da segurança, que gerou a violência usada, como forma de manterem-se seguros, e garantindo a sobrevivência. O ‘leitmotiv’ da segurança seria deter o perigo de fora, que gerava o medo, e, ao mesmo tempo, construir uma sociedade de paz, por um conjunto de boas ações, cujas ações caberiam ao Estado promovê-las, já que legitimado a praticar o ‘terror originário’, como suporte para a ordem pública e paz social. A falta do medo em dois momentos históricos da humanidade - forte é o meu sentimento - foi o que levou os primeiros cristãos ao martírio na Roma antiga, martírios repetidos nos seus mais de 2000 anos seguintes *, assim como ocorreu com os judeus *, no caso do holocausto nazista, e, certamente, porque a resignação era o traço comum nesses filhos de Abrahão. A ausência do medo levou judeus e cristãos encarar com bravura e estoicismo sem precedentes. Os monges Tibetanos também se entregaram sem medo às baionetas dos chineses. O sociólogo e cientista político, Aldo Fornazieri, lembra que foi assim na história longínqua e mais raramente nos tempos modernos, quando se criaram os grandes Estados. ‘Foi assim com Moisés que passou no fio da espada milhares de hebreus ao voltar do Monte Sinai e vê-los a adorar ídolos de ouro; foi assim com Ciro que se revoltou contra os medas ao fundar o Império Persa; foi assim com Rômulo que eliminou seu irmão para garantir a segurança de Roma; foi assim com os Estados Unidos que fizeram a Guerra da Independência para fundarem a sua nação. O ‘terror originário’ é uma exigência mesma do caráter ambivalente dos seres humanos, definido como natureza e como cultura, como animal e como ser racional e desejante’. Sem o medo, suscitado pelo terror originário, o poder não se constituirá adequadamente, e a lei não terá a força de codificar a violência monopolizada e legítima do Estado. Mas, a medida da sua aplicação, é que poderá temperar o medo individual e coletivo, que, acossado, poderá reagir. E é o que se tem visto nas manifestações e protestos de rua no presente - uma reação sem propósitos bem definidos, mas certamente com causas facilmente diagnosticáveis - medo, medo da exclusão, medo da invisibilidade social, medo de não ser convidado para a prosperidade, medo que a proteção racional, buscado no contrato social aprofunde o abismo social. • Extraído do ‘Sepulturas de Vincennes estão em Búzios’. • ‘Estado de natureza’ na visão de Thomas Hobbes; não de Jean Jacques Rousseau. • As duas obras ficaram na Biblioteca Monteiro Lobato da Fundação Bem Te Vi que apropriada pelo governo municipal. • No sentido, de pessoas normais, comuns. • ‘Martyrologium Romanum’, do Papa Gregório XIII, da Editora Vozes 1954. • O povo judeu acabou sendo o ‘bode expiatório’ em várias passagens da humanidade, produzindo a cena do Talmude, onde era previsto o sacrifício de um bode, sacrificado e jogado no deserto, para ser apanhado pelo anjo caído, e lavado os homens dos pecados.
Posted on: Sat, 02 Nov 2013 11:46:25 +0000

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