Os Beatles e as drogas pt. 5 Sgt. Pepper’s Paul teve a - TopicsExpress



          

Os Beatles e as drogas pt. 5 Sgt. Pepper’s Paul teve a idéia: neste álbum eles não seriam os Beatles. Essa seria sua válvula de escape. Eles pensariam um novo nome, um novo jeito de ser, um novo modo de gravar. E chegaram ao consenso de que não seria mais John, Paul ou George cantando. Eles seriam quem quisessem ser. O álbum tem o propósito de apresentar um concerto da Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, uma espécie de cruzamento entre as bandas de metais uniformizadas de Liverpool com os grupos californianos de rock psicodélico que invadiam a cena pop no final de 1966. Como experimentação de mudança de formato, a personificação dos Beatles como a Pepper´s Band estava em sintonia com o espírito de um tempo em que jovens adotavam identidades imaginárias e se aliavam a comunidades imaginárias fundadas sob a crença do poder transformador das drogas que expandiam a mente. Microfones posicionados bem abaixo das bocas dos instrumentos de metais, fones de ouvido transformados em microfones, enormes quantidades de ecos nos vocais, enormes variações de velocidades dos instrumentos e dos vocais. Isso e muito mais pretendia inaugurar uma nova viagem sonora, como que a sensação de uma droga sendo usada pela primeira vez. Não há como negar a influência das drogas na sensibilidade artística que produziu o projeto Pepper. A maconha era um item importante no método criativo dos Beatles desde 1964/1965, e seu efeito no modo como compunham era por demais penetrante para ser abandonado agora. O próprio conceito que Paul trouxe para o disco era como que um sonho estendido da droga, sustentado pela capacidade da maconha inspirar momentos de fantasia coletiva entre grandes amigos. Muito disso vem da decisão de Paul te finalmente experimentar o LSD, contribuindo para formar a consciência coletiva que tornou possível a execução de sua ideia. O contato com o ácido o preencheu com uma sensação nova e expansiva de possibilidades. Com esse novo laço, Lennon e McCartney voltaram a trabalhar juntos com uma intensidade que lembrava os seus primeiros anos como Beatles. O disco abre com os murmúrios de uma platéia de teatro e a cacofonia abafada de uma orquestra afinando. Alguns segundos depois a banda entra num improviso letárgico de rock com o ritmo demarcado no contratempo por uma guitarra estridente. Segue-se uma pausa, e Paul aparece com a voz sem fôlego de um mestre de cerimônias que apresenta “the act you´ve known for all these years”, estabelecendo o cenário para os ouvintes no teatro e pra todos em casa: “It was twenty years ago today, Sgt. Pepper taught the band to play”. Aplausos, assovios e gritos tomam o lugar, o coro de sopros segue pela escala, sendo interrompido por uma gargalhada, resposta a uma imagem que provavelmente se passa entre o mestre de cerimônias e a banda. Para aqueles que não compareceram a esse concerto de vinte anos de carreira da banda, é impossível saber o que seria isso. A banda é como a projeção de algo parecido com os Beatles com vinte anos de estrada, como se eles tivessem seguido em frente, fazendo turnês e reprisando seus sucessos. Após o animado número de abertura, Paul volta ao microfone para apresentar o convidado da noite: Billy Shears. E temos uma guitarra que dedilha a abertura de “a Little Help From My Friends”. Shears seria o equivalente rock n´roll de um astro envelhecido de um teatro de variedades: “What would you think if I sang out of tune/ Would you stand up and walk out on me?”. Na música seguinte a paródia do show busines sai de cena, dando espaço a possibilidades fictícias mais amplas sugeridas pela decisão da banda de se disfarçar na banda do sargento pimenta. “Lucy in the Sky With Diamonds” começa com uma introdução de caixinha de música, com John cantando como uma criança sonolenta acompanhado de forma esparsa pelo baixo de Paul, que desce uma nota por compasso. “Picture yourself in a boat on a river, with tangerine trees and marmalade skies/ Somebody calls you, you answer quite slowly – a girl with kaleidoscope eyes”, diz a letra, entre sonho, delírio infantil e viagem de ácido. A constituição onírica continua por toda a música, sobre uma paisagem surreal de flores gigantescas, até a estrofe final, onde vemos um trem na estação e um lampejo final a garota com olhos de caleidoscópio. Ao longo do disco temos sátiras sobre a Inglaterra dos anos 1950 (Getting Better), analogias entre a expansão da mente e a renovação doméstica (Fixing a Hole), uma belíssima balada preparada com clichês vitorianos (She´s Leaving Home), evocações ao circuito de feiras populares e parques de diversões do século XIX (Being for the Benefit of Mr. Kite!), atrações musicais exóticas, que com explícitas pretensões à seriedade se torna, no contexto do disco, mera brincadeira (Within You Without You), músicas de cortejo à moda antiga (When I´m Sixty Four), músicas extrovertidas (Lovely Rita), algo como um café da manhã do inferno, depois suavizado (Good Morning, Good Morning) e finaliza repetindo o tema de abertura, dando ao Pepper Show um começo, um meio e um fim. Se o disco terminasse aqui já seria soberbo. Mas ainda há um diamante guardado. No contexto do disco, “A Day in the Life” pode ser visto como um bis. Ainda assim, a faixa é antítese de tudo o que veio antes, como que se existisse numa realidade paralela ou alternativa. O resultado é tão poderoso que periga transformar todo o resto num prelúdio, como um conjunto de sonhos ou de memórias carinhosas. Após as estrofes cantadas com voz lânguida por Lennon, as referências ao cotidiano e a trivialidade da vida de um jovem rico que morre num acidente de trânsito, com direito a um trocadilho macabro com uma gíria do mundo das drogas: “blow your mind”. Chega então a epifania. O violão e a bateria somem, deixando a pulsação do baixo e do piano, enquanto um burburinho se forma num novo espaço sônico. Esse som sobe conforme as cordas refletem a ondulação da voz e John, para depois alçar vôo de forma tresloucada. A orquestra viola todos os princípios disciplinados de sua prática de execução, tentando deliberadamente não tocar junta. Abre-se então um plano de sensações sonoras puras, transformando os 24 compassos que duram esse interlúdio numa eternidade vertiginosa que varre os marcos musicais, para terminar de súbito. Então, num local bem distante de onde a música começou. Paul canta rapidamente, em oposto absoluto ao vocal de John nas estrofes, sobre sua rotina matinal. A música parece passar para outra dimensão através daquela exuberante erupção musical. No meio disso a voz de John retorna, com um grito enervado, percorrendo um fraseado harmônico que leva a música de volta ao tom original, caminhando solenemente para seu final. O som da orquestra transcende mais do que todo o resto das músicas. É um pesadelo que encerra o show dentro do disco dos Beatles. O chão se precipita sob nossos pés. Há então um lampejo de silêncio, que se rompe pelo impacto assombroso de um acorde ao piano, que permanece no espaço até se esvair lentamente, uma meditação de quarenta segundos que nos deixa ouvindo o nada absoluto com atenção e consciência renovadas. É aquela contemplação matinal silenciosa, a introspecção que cada um sente quando a festa acaba e o efeito do doce começa a se dissipar. Fonte: growroom.net/board/topic/34911-os-beatles-e-as-drogas/
Posted on: Wed, 06 Nov 2013 23:14:42 +0000

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