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Paulo Gil Martins há cerca de uma hora perto de Lisboa · EM PORTUGAL SÓ SE DISCUTE A FLORESTA QUANDO ELA ARDE Transcrevo hoje um texto do Jornal Público do Verão de 2010... escrito pelo Jornalista Manuel Carvalho sobre incêndios florestais e os seus MITOS... texto bem elaborado e com o qual concordo em absoluto... Espero que seja lido pelos atuais protagonistas mediáticos, sejam eles políticos, técnicos ou operacionais e não só... pois trata-se de informação bem investigada e portanto credível... e que permite que não se digam tantas ASNEIRAS sobre o tema... Chamo especial atenção quanto aos MITOS sobre incêndios florestais, que mais uma vez este ano se apresentam (como em todos os outros) falando-se do que se desconhece, falando-se do que não é verdade... e que serve para nos confundir... A verdade é só uma... o resto são palavras muitas vezes patéticas e sem qualquer fundo de razão, próprias para ludibriar os menos atentos a estas questões... porque a nossa memória é muito curta... e todos os anos o processo mediático é o mesmo... EM PORTUGAL SÓ SE DISCUTE A FLORESTA QUANDO ELA ARDE Após quatro anos de acalmia, os grandes fogos florestais regressaram. Por entre mitos e verdades, o PÚBLICO foi à procura das causas e consequências deste flagelo. Manuel Carvalho Um final de Julho e duas semanas do início de Agosto especialmente quentes e secas foram o suficiente para que o fogo voltasse a devorar importantes áreas da floresta portuguesa e para que o debate sobre o velho drama do Verão se incendiasse. Como habitualmente, as responsabilidades pela destruição de mais de 70 mil hectares de povoamentos florestais e de matos até 15 de Agosto foram atribuídas aos suspeitos do costume: aos madeireiros, aos proprietários absentistas, aos criminosos de delito comum e até, em casos mais raros, à alegada incompetência dos comandantes de bombeiros. Num palco dominado pelo ministro da Administração Interna, o congénere da Agricultura fez a sua aparição ocasional para advertir que o Governo estudava a possibilidade de intervencionar as explorações florestais abandonadas. Onde está a razão neste debate, onde começam os mitos e acaba a realidade é uma equação para a qual nunca haverá uma resposta definitiva. No balanço até agora, o que é facto é que muitas das acusações, mesmo divergentes, lançadas por silvicultores, geógrafos, bombeiros, polícias ou ambientalistas fazem sentido. Porque é verdade que a falta de gestão da maior parte das explorações florestais permite a acumulação de material combustível que, em dias mais quentes e secos, torna as chamas incontroláveis; está provado que o abandono das zonas rurais e o fim do pastoreio tradicional alterou as regras do ancestral equilíbrio nas florestas, tornando-as vulneráveis aos incêndios; é verdade também que, apesar de o novo dispositivo de ataque aos fogos mostrar sinais de maior eficácia, os meios aéreos e humanos em acção só podem dar uma resposta a 200 ou 250 incêndios por dia, quando este Verão o número de ocorrências chegou a ultrapassar as 500; é certo que uma fatia importante dos fogos tem mão humana e criminosa, como o atesta o facto de 38 por cento das ignições acontecerem durante a noite; finalmente, é verdade que, como dizem os ambientalistas, a falta de ordenamento florestal está na origem dos grandes incêndios que, como este ano aconteceu no Soajo ou em São Pedro do Sul, podem devorar ao longo de dias milhares de hectares, o que plantações alternadas de folhosas e resinosas poderiam impedir (os especialistas notam que há uma pausa na "adaptação" das chamas quando há uma transição entre espécies). O problema maior da floresta portuguesa, porém, não resulta da falta de discussão pública, de saber técnico ou de experiência acumulada. Quando os fogos se tornaram um problema público e político, na primeira metade da década de 1990, a floresta mobilizou a opinião pública e, por arrastamento, os decisores. Foi à luz dessa preocupação que se aprovou em Agosto de 1996 uma Lei de Bases na qual se concentraram receitas e depositaram esperanças ou se lançou um Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta. Mas passaram anos, quase uma década, até que aparecessem as primeiras leis regulamentares para cumprir a missão da lei-quadro. E para que os Planos Regionais de Ordenamento Florestal ou as Zonas de Intervenção Florestal vissem a luz do dia, foi necessário aguardar pelas calamidades de 2003 e de 2005. Entretanto, o corpo dos serviços florestais foi integrado na orgânica da Agricultura, burocratizou-se e perdeu a sua ancestral ligação à realidade da floresta; e com o Governo de José Sócrates a prioridade deixou de ser a gestão, a propriedade ou o ordenamento para dar lugar à criação de um dispositivo de combate mais eficaz. Andámos pouco e devagar Em 2006, 2007, 2008 e 2009 o registo dos fogos florestais pareceu dar razão a esta estratégia. Este ano constatou-se que, mesmo estando a área destruída ainda dentro dos objectivos traçados até 2012 (abaixo dos 100 mil hectares anuais), enquanto a floresta não tiver um dono, enquanto o país não for capaz de criar condições para multiplicar a gestão que se faz em zonas de intervenção florestal como a do vale do Sousa ou nos perímetros das empresas de celulose, a sorte da floresta continuará a depender dos caprichos do clima. Com o Estado incapaz de gerir as suas matas ou de cumprir a sua missão nos baldios, os melhores exemplos da gestão privada são, para muitos, a melhor garantia de que é possível travar o flagelo do fogo e aproveitar da melhor forma os recursos. Para que esta estratégia seja viável, é, no entanto, fundamental criar um cadastro florestal que identifique as propriedades e os seus donos e criar incentivos e penalizações fiscais que levem os proprietários a tratar das suas florestas ou, em caso de abandono, a vendê-las para não terem de pagar impostos. Em dois anos, criaram-se 127 Zonas de Intervenção Florestal que mobilizam proprietários, autarquias e técnicos. Sem incentivos suplementares, a maioria está ainda no papel, à espera de um empurrão para cumprir a sua missão ao nível da prevenção contra os fogos, da gestão e do negócio florestal. Quase 30 anos depois de os fogos entrarem no centro das preocupações do país, verificase assim que se andou pouco e devagar. Seja ao nível da política, seja da economia, a aposta na floresta demora anos a gerar dividendos. Não há nada de espectacular num investimento em 300 hectares de sobreiros ou na criação de linhas corta-fogo numa serra perdida do interior. É mais vistoso, e mais imediato, comprar um Kamov do que financiar a recuperação de mil hectares de pinheiros. Os custos desta opção estão à vista. Ainda que os incêndios não tenham provocado uma grande razia na área florestal (em dez anos regrediu 62 mil hectares), há uma espécie importante que se transformou para já no símbolo da destruição: o pinheiro bravo. Entre 1995 e 2005/2006, data do último inventário florestal, a área de pinho reduziu-se 266 mil hectares. Ou seja, cerca de 30 por cento. E sem medidas de fundo, tudo indica que o pinhal continue a regredir. Pode haver mais um ano ou dois de relativo apaziguamento, mas, a prazo, a discussão de 30 anos sobre a incapacidade de o país aproveitar o seu mais importante recurso natural renovável continuará a regressar nos meses de Julho e Agosto. MITOS E VERDADES SOBRE O FOGO E A FLORESTA 1. Este ano ardeu mais, ou menos, do que a média da última década? Até 15 de Agosto, segundo os dados da Autoridade Florestal Nacional, arderam 71.687 hectares, ou seja, menos 30.962 hectares que a média dos últimos dez anos no mesmo período. Esta média inclui anos trágicos como 2003 (425 mil hectares) e 2005 (338 mil hectares) - no conjunto perto de 14 por cento da área florestal nacional -, mas também anos benignos como 2007, com pouco mais de 17 mil hectares ardidos, o valor mais baixo desde que há registos. A área ardida deste ano é muito superior à dos últimos três anos. No ano passado, até 15 de Agosto tinham ardido 26 mil hectares, mais vinte mil hectares que em 2007. Em 2003, nesta altura as chamas já tinham destruído 372 mil hectares. 2. As condições do clima este ano foram piores do que em anos anteriores? O valor médio mensal do índice de risco de incêndio FWI para o mês de Julho foi ligeiramente inferior ao valor de 2005, estando acima dos valores dos últimos cinco anos e do valor médio considerado, refere o Instituto de Meteorologia (IM). Até meados de Agosto, o índice de severidade diário era superior ao de 2003 e apenas inferior ao de 2005 e 2006. O IM nota que, entre 1 a 12 de Agosto, o território continental registou uma média da temperatura máxima do ar de 33,9°C, o que significa uma anomalia de mais 5,1°C em relação ao valor normal de 1971-2000 (28,8°C) para este mês. "Estas condições traduziram-se num aumento significativo do risco meteorológico de incêndio e, consecutivamente, do índice de severidade diário, resultando em maiores dificuldades no controlo e supressão dos incêndios florestais", lê-se no último relatório da Autoridade Florestal Nacional. Em termos do clima, Julho foi um mês seco e muito quente, registando o maior valor da temperatura máxima do ar, 31,7°C, desde 1931. Neste mês ocorreram duas ondas de calor e, em relação à precipitação, Julho foi o mais seco dos últimos 24 anos. 3. Como se pode explicar o elevado número de incêndios registados por dia em Agosto? O número de ignições registadas em Portugal é um dado que ainda hoje intriga os especialistas, que alertam para a necessidade de se estudar melhor este fenómeno. É que Portugal sozinho regista mais ocorrências do que a Espanha, um país com uma área cinco vezes superior. E mais do que qualquer país do Sul da Europa, com quem partilha o mesmo tipo de clima. Até 15 de Agosto tinham sido registados 14.661 fogos, a maioria dos quais com uma área ardida inferior a um hectare (12.212). Em 2006, por exemplo, Portugal contabilizou perto de 22 mil ocorrências, enquanto a Espanha registou pouco mais de 16 mil. A França teve 1871 ocorrências, a Itália 5471 e a Grécia 8874. Mas mais grave do que o número de ocorrências é a sua concentração, já que o dispositivo de combate só está preparado para responder a um máximo de 250 ignições/ dia. Contudo, a 8 de Agosto registaram-se 501, sendo a média dos primeiros quinze dias do mês 324 fogos/dia. E a grande maioria acontece em cinco distritos: Porto (4125), Aveiro (2147), Braga (1703), Viana do Castelo (1552) e Viseu (1264). 4. O dispositivo de combate tem sido eficaz? O dispositivo de combate aos incêndios florestais foi reforçado depois dos anos trágicos de 2003 e 2005. O Estado adquiriu dez helicópteros, em grande parte devido aos fogos, e há mais meios aéreos a operar no Verão, tendo sido adoptada uma nova estratégia de os utilizar, que privilegia a primeira intervenção. Introduziu-se a filosofia do comando único e criou-se a Força Especial de Bombeiros com mais de 250 elementos e o Grupo de Intervenção, Protecção e Socorro da GNR, com mais de 600 militares, ambos numa lógica de profissionalização do combate. Trouxe-se conhecimento para o dispositivo, com a criação do Grupo de Análise e Uso do Fogo. Os especialistas concordam que o dispositivo de combate está mais eficaz, mas há quem saliente que há muito por onde evoluir. A formação dos comandantes, a coordenação das várias entidades no teatro de operações e a logística no terreno são algumas das áreas a melhorar. 5. Como tem evoluído o dispositivo de combate nos últimos anos? As tragédias de 2003 e 2005 obrigaram a mudanças profundas no dispositivo de combate. Hoje há mais meios do que nunca. A frota aérea é composta por 56 aparelhos, contra os 38 contratados para actuar em 2003 e os 49 em 2005. Também significativo foi o aumento a nível dos meios humanos, que, entre 2003 e 2010, quase triplicaram (de 3344 passaram para 9985 elementos). 0 que também triplicou foram os custos, que em cinco anos aumentaram de 36,6 milhões de euros para 103 milhões de euros. 6. Quem manda no combate aos fogos? Em 2006, na sequência da nova lei de bases da Protecção Civil, foi criado o Sistema Integrado de Operações de Protecção e Socorro, que define as regras de articulação entre as várias entidades ligadas a esta área no teatro das operações. Introduziu-se assim a filosofia do comando único, que salvaguarda, contudo, a dependência hierárquica de cada organismo. Na Autoridade Nacional de Protecção Civil está o Comando Nacional de Operações de Socorro (o CNOS possui um comandante nacional, um segundo comandante e três adjuntos), que está no topo da hierarquia de comando das operações. A nível distrital existem os Comandos Distritais de Operações de Socorro, também com um comandante e um segundo comandante, responsável por este nível. Todos os anos o CNOS emite uma directiva operacional, que dá conta dos meios disponíveis em cada fase dos incêndios e do funcionamento do dispositivo. Mas quem comanda no combate de um fogo é o primeiro a lá chegar, sendo depois substituído normalmente por um comandante dos bombeiros locais. Os casos mais complexos são geridos pelos comandantes distritais ou por um responsável do CNOS. 7. A maioria dos fogos tem origem criminosa? Não. Este ano, o Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, responsável pela investigação das causas dos incêndios florestais, já terminou 3943 inquéritos, tendo concluído que a maioria (44 por cento) é de origem negligente. Os fogos intencionais representam 22 por cento do total e as causas naturais são responsáveis por apenas dois por cento das ignições investigadas. Não foi possível determinar a causa de um terço dos fogos. Os números não são muito diferentes dos do ano passado, em que foram investigadas 12.176 ocorrências. As queimadas estiveram na origem de 33 por cento dos incêndios, enquanto a queima de lixo, o fumar e as fogueiras explicaram, cada um, um por cento das ignições. O incendiarismo foi a causa de 26 por cento das ocorrências. Até 2005, a investigação das causas estava a cargo do Corpo Nacional da Guarda Florestal, extinto nesse ano e cujos profissionais foram integrados na GNR. Nessa altura fazia-se uma média de 1200 investigações por ano. No entanto, era maior a taxa dos casos em que se concluía por uma determinada causa. 8. O papel reservado às autarquias na prevenção e combate aos fogos está a ser cumprido? Os incêndios de 2003 resultaram numa profunda reforma nesta área, com os municípios a assumirem novas competências. Em 2004, criam-se as Comissões Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios para substituírem as anteriores estruturas - as CEFF. Até ao início do ano só três concelhos não dispunham ainda deste organismo, nos 278 existentes no continente. Estas comissões são responsáveis pela promoção e execução a nível local da política de Defesa da Floresta contra Incêndios, sendo obrigatório a elaboração dos planos municipais (os PMDFCI), o que quase todos (270) os municípios cumpriram. Mas já são menos (250) os que possuem Gabinetes Técnicos Florestais, que põem em prática as políticas definidas pela câmaras, e menos ainda (149) os que dispõem de Planos Operacionais Municipais que concretizam os PMDFCI. No terreno muitos queixam-se de que há planos desactualizados, que não servem para nada. Um estudo do Instituto de Estudos Sociais e Económicos, de 2007, apontou três problemas ao trabalho dos Gabinetes Técnicos Florestais: profissionais inexperientes, estruturas isoladas nas câmaras e muitas vezes desviadas para outras funções. No combate foi criada, em 2007, a figura de comandante operacional municipal, contra a vontade dos municípios. Em Agosto, a Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e Protecção Civil estimava que apenas 20 por cento das autarquias portuguesas tivessem este comandante de nível municipal. 9. A floresta do Estado arde mais do que a privada? A Autoridade Florestal Nacional (AFN) tem sob sua gestão 529.620 hectares de matas nacionais e perímetros florestais, a maior parte dos quais são baldios. O ano de 2005 foi, no último decénio, aquele que apresentou maior área ardida nas florestas de gestão públicas, tendo os incêndios florestais destruído mais de 16 mil hectares. O ano passado os incêndios ocorridos em áreas sob gestão directa da AFN queimaram 13,3 mil hectares, o que representa 15 por cento da área ardida. Foram registadas nestas áreas 577 ocorrências, o que significa dois por cento do total. Em 2009, percentualmente, ardeu bastante mais nas áreas geridas pelo Estado do que nas áreas geridas por privados. Já em 2005, a situação inverteu-se, com a floresta privada a arder duas vezes mais que a de gestão pública. 10. As espécies florestais portuguesas são mais vulneráveis ao fogo? Pinheiro-bravo, eucalipto e sobreiro são as três espécies florestais que mais área ocupam no país, de acordo com o Inventário Florestal Nacional (2005 2006). As primeiras duas são especialmente atreitas a incêndios e entram em ignição mais facilmente, devido às suas características intrínsecas, explica Joaquim Sande Silva, investigador em fogos florestais na Escola Superior Agrária de Coimbra e no Centro de Ecologia Aplicada Prof. Baeta Neves. As folhas do eucalipto e do pinheiro-bravo têm menor teor de humidade em relação a outras espécies. Para agravar o cenário, estas árvores têm óleos (eucaliptos) e resinas (pinheiro), lembra Joaquim Sande Silva. Mas não é tudo."Estes povoamentos florestais criam um ambiente seco ao nível do solo, propício aos incêndios", disse, lembrando que os fogos começam sempre na vegetação. Já o sobreiro, a nossa folhosa autóctone com maior representação, "resiste muito ao fogo por ter uma casca grossa, apesar de também arder como as outras árvores". Os montados conseguem manter mais humidade ao nível do solo. Helena Geraldes 11. Há interessados nos incêndios? Muito se fala na gíria popular das redes criminosas ligadas ao fenómeno dos incêndios. Contudo, as alegadas máfias do fogo, ligadas à indústria da madeira, aos interesses imobiliários ou às empresas de meios aéreos, nunca foram detectadas nas investigações da Polícia Judiciária, que tem competência exclusiva para investigar os incêndios dolosos. Desde 1997 que o Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais estuda os incendiários condenados e, a partir de 2000, os detidos pelas autoridades, tendo concluído que mais de 90 por cento são homens e a maioria tem mais de 36 anos. Na generalidade, fazem-no fruto de perturbações psíquicas ou por vingança. Desde que em Setembro de 2007 o Código Penal autonomizou o crime de incêndio florestal, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais contabiliza vinte pessoas condenadas, 12 das quais foram consideradas inimputáveis e obrigadas a cumprir medidas de internamento em instituições psiquiátricas. "A opinião pública sobrestima fortemente as causas intencionais com objectivos económicos (que são insignificantes) e praticamente ignora as associadas a produção agro-pecuária, as realmente mais comuns", nota Tiago Oliveira, engenheiro florestal, que fez parte da equipa que elaborou a proposta técnica do Plano Nacional de Prevenção e Protecção da Floresta contra Incêndios. 12. Os incêndios são um bom negócio para os madeireiros? Em casos específicos, sim. Enquanto no caso do eucalipto as empresas de celulose recusam madeira com qualquer vestígio de carvão (o que afecta a qualidade da celulose) e pagam exactamente o mesmo preço por metro cúbico à entrada da fábrica, no caso do pinho a realidade pode ser diferente. Depois de um fogo, os troncos de uma floresta de pinheiro-bravo ou são imediatamente cortados e entregues às serrações, ou começam a ganhar uma espécie de bolor que lhe muda a cor e impede a sua utilização, por exemplo, na indústria do mobiliário. Quer isto dizer que, após um incêndio, os produtores afectados tratam imediatamente de colocar o que resta dos seus espaços florestais à venda, aumentando a pressão da oferta sobre a procura. Este cenário acaba por beneficiar os madeireiros, que aproveitam para baixar os preços e escolher os melhores lotes da madeira que chega ao mercado. Esta baixa de preços repercute-se igualmente na indústria. Mas, no processo, são os madeireiros, que, regra geral, dominam o mercado de uma determinada área florestal, quem mais pode ganhar com os fogos. 13. Os incêndios são um bom negócio para a especulação imobiliária? Desde 1990 que a lei proíbe a construção, pelo prazo de 10 anos, em povoamentos florestais percorridos por incêndios, em áreas não classificadas nos planos municipais de ordenamento do território como solos urbanos. Contudo, a partir de 2007, introduziu-se a possibilidade de, por despacho conjunto dos ministros do Ambiente e da Agricultura, serem levantadas as proibições, desde que se comprove que a origem do incêndio se fica a dever a causas a que os interessados são alheios. Actualmente a legislação também proíbe a construção de edificações para habitação, comércio, serviços e indústria nos terrenos classificados nos Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios com risco de incêndio elevado ou muito elevado. Há, contudo, quem interrogue a aplicabilidade destes diplomas, alegando que muitas vezes ninguém os fiscaliza. 14. Existe legislação específica para o ordenamento florestal? Um dos problemas que repetidamente se associam ao drama florestal relaciona-se com o labirinto da legislação. Depois de vários anos de debate, a Assembleia da República aprovou em 1996 a Lei de Bases da Política Florestal, que, naturalmente, se tornou a matriz do ordenamento florestal português. Aí se previam dois níveis principais de intervenção: a escala regional e a escala da associação local de produtores. Para a primeira, foram lançados os Planos Regionais de Ordenamento Florestal (PROF), para as segundas as Zonas de Intervenção Florestal (ZIF), cuja aprovação estaria dependente de planos de acção nos quais se determinariam as regras básicas do ordenamento e da gestão desses espaços, incluindo medidas ao nível da prevenção dos fogos. Os PROF, porém, demoraram três anos a ser regulamentados e a sua publicação só aconteceu depois de 2006. As ZIF, por seu lado, tiveram enquadramento legal em 2005 (nove anos depois de previstas na lei de bases) e, entretanto, foram-se disseminando pelo território. Actualmente há 27 no Norte, 64 no Centro, 18 em Lisboa e Vale do Tejo, duas no Alentejo e 16 no Algarve. Mais crítico do que o seu número é a sua operacionalidade: na sua grande maioria, as ZIF continuam no papel, sem qualquer acção concreta ao nível do planeamento e ordenamento. Falta-lhes uma competência básica: a de poderem vender os produtos da exploração florestal. Sem este estímulo, "vai ser difícil obter os resultados que se esperavam das ZIF", diz João Soares, agrónomo e ex-secretário de Estado das Florestas. 15. O abandono rural explica o drama dos incêndios? Os especialistas concordam que o abandono rural explica em grande parte o problema dos incêndios. Até à década de 50, nota Américo Mendes, professor da Faculdade de Economia da Universidade Católica e produtor florestal, o risco de incêndio estava controlado "devido à existência de uma população rural numerosa e com usos e costumes que permitiam o controlo da massa combustível na floresta a níveis que reduziam esse risco de incêndio". Com o êxodo rural, os custos de mão-deobra para uma gestão florestal sustentável começaram a ser cada vez mais elevados, conduzindo a rentabilidade privada da produção florestal para níveis negativos. "Os grandes incêndios de 2003 e 2005 não são mais do que o auge das consequências negativas desse problema económico de fundo, que tem vindo a desenvolver-se, pelo menos, desde os anos 50, sem políticas públicas que ajudem a resolvê-lo ou, pelo menos, atenuá-lo", defende o docente na apresentação "Política Florestal em Portugal depois de 2003". 16. O que vale a floresta portuguesa? A floresta é o mais importante recurso renovável do país. Por alturas da integração europeia, acreditou-se que a prazo se poderia transformar numa espécie de petróleo verde. Com o início da razia dos incêndios, nos anos 90 e principalmente entre 2000 e 2005, esse "sonho florestal português" deixou de fazer sentido. Mas, apesar de todas as dificuldades por que o sector passa, principalmente na fileira do pinheiro-bravo, a floresta tem um valor estimado por Tiago Oliveira em 7750 milhões de euros e é a base de uma fileira que gera aproximadamente cinco mil milhões de euros por ano, representando três por cento do valor acrescentado bruto da economia (VAB) e 15 por cento do total das exportações. Olhando para estes valores, vale a pena notar que, de acordo com as estimativas de Américo Carvalho Mendes para 2001 e 2004, a venda de produtos lenhosos, a caça, a recolha de cogumelos, o sequestro de carbono acrescentavam cerca de 1300 milhões de euros à economia. A maior fatia da riqueza florestal provém, no entanto, de produtos transformados, com destaque para o papel e derivados da cortiça, que representam 61 por cento do valor das exportações do sector. A floresta gera aproximadamente 150 mil postos de trabalho directos. 17. De quem é a floresta portuguesa? A floresta portuguesa é quase exclusivamente privada. Ao contrário da regra que se verifica em boa parte dos países da Europa, a propriedade pública florestal é muito reduzida, limitando-se a 86 mil hectares, entre matas nacionais ou parques naturais. Ou seja, cerca de dois por cento dos 3,4 milhões de hectares ocupados pela floresta nacional, de acordo com o inventário de 2005/06.O domínio absoluto dos espaços florestais pertence a cerca de meio milhão de proprietários privados, que dispõem de pouco mais de 84 por cento da área florestal. A maioria destes proprietários (61 por cento) possui uma área inferior a cinco hectares, uma dimensão com pouca viabilidade económica que estimula o abandono. "Alguns herdaram e não sabem, outros emigraram, alguns desistiram de cuidar dos terrenos, outros mudaram-se para as cidades", lamentou, numa entrevista ao DN, o secretário de Estado das Florestas, Rui Barreiro. No capítulo da floresta privada, vale a pena notar que as empresas produtoras de pasta e de papel detêm já uma área florestal estimada em 250 mil hectares, ou seja, 7,7 por cento do total. Finalmente, uma área da floresta nacional correspondente a meio milhão de hectares é ocupada pelos espaços comunitários, mais conhecidos por baldios. 18. O Estado devia intervencionar as matas abandonadas? O princípio de que deve haver penalizações para quem não cuida de um bem privado de interesse público como é a floresta é defendido por vários especialistas. Quanto à possibilidade de ser o Estado a exercer essa penalização através da intervenção directa nas explorações florestais, as divergências são mais nítidas. Mesmo estando prevista na legislação florestal de alguns países europeus, a ingerência directa do Estado exigia que as taxas de abandono de espaços florestais fossem reduzidas e reclamava uma administração pública capaz de identificar e punir as infracções. Ora, a Autoridade Florestal Nacional, herdeira da outrora poderosa e qualificada Direcção-Geral das Florestas que se diluiu na máquina do Ministério da Agricultura, não tem recursos capazes sequer para garantir a gestão das matas do Estado. Como alternativa, há quem defenda penalizações de natureza fiscal para os absentistas. João Soares é há anos um convicto advogado desta medida, que passa pelo agravamento do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) para as propriedades abandonadas. Esta medida teria de ser antecipada pela construção de um cadastro florestal, que espera há décadas para ser concretizado, e a fiscalização do absentismo e da negligência seriam transferidos do Ministério da Agricultura para o Ministério das Finanças. "Tendo de pagar impostos elevados, os proprietários absentistas teriam mais disponibilidade para vender, o que dinamizaria o mercado fundiário em Portugal", diz João Soares. M.C. 19. Em que estado estão as matas comunitárias? As matas comunitárias, mais conhecidas por baldios, são actualmente um dos principais problemas da floresta nacional. O Governo lançou este ano um debate público para se avaliar o que fazer com uma área de meio milhão de hectares que se encontra num limbo de indefinição entre a memória comunitária de outrora e a realidade actual do mundo rural, onde rareiam pastores e a floresta deixou de ser uma fonte providencial de recursos. Regidos por uma lei de 1983, os baldios podem ser geridos por assembleias de compartes eleitos pelos povos de uma determinada área, ou, por delegação, pelo Estado via serviços florestais. A maioria dos baldios segue esta modalidade. Pelo lado dos serviços florestais, o que tem sido feito são apenas cortes ("uma actividade mineira", na expressão de João Soares), não havendo recursos nem disponibilidade para operações de silvicultura. Pelo lado dos compartes, as receitas obtidas com a venda de madeira servem para reparar capelas ou fontes, quase nunca para reinvestir na floresta. Face a estas lacunas, os baldios degradaram-se ou arderam mais rapidamente que o resto da floresta. Em muitos casos, os compartes são apenas representantes de facções políticas que ali encontram outra forma de prolongar ou de se oporem à acção das juntas de freguesia ou dos municípios. 20. A floresta portuguesa está na pior situação de sempre? Errado. A floresta está hoje numa situação muito mais complicada do que há dez anos. Mas a crença de que Portugal era há 100 anos um país coberto de árvores de Norte a Sul não resiste à análise da História. De acordo com o investigador Inocêncio Seita Coelho, em 1867 a área florestal representava 14,1 por cento do território; em 1995 ocupava 38,2 por cento, um valor muito próximo do actual. Olhando em perspectiva desde os anos 80, houve uma espécie florestal que reforçou a sua presença no espaço florestal: o sobreiro. O eucalipto, a segunda espécie mais importante da floresta, recuou ligeiramente. A azinheira e o carvalho, a quarta e quinta espécies em termos de área, assinalaram recuos mais pronunciados. Mas, no caso do pinheiro, a situação é trágica: em dez anos, a sua área reduziu-se 266 mil hectares, ao ponto de pôr em causa a sobrevivência económica da importante fileira industrial que lhe está associada. Esta espécie foi a principal vítima dos incêndios que devastaram o país entre 2000 e 2006. Enquanto os eucaliptais se regeneram naturalmente após um incêndio, os pinhais exigem operações silvícolas de manutenção para sobreviver. Se o pinhal destruído tiver mais de 15 anos, pode ter deixado no solo sementes para germinar. Mas as plantas jovens têm de conviver com mato altamente combustível. E "há sempre uma forte probabilidade de este mato arder antes de os pinheiros atingirem os 15 anos". Quando esta situação acontece, o pinhal desaparece. Como tem desaparecido. Transcrito na íntegra de um artigo do Jornal Público no Verão de 2010, da responsabilidade de Manuel Carvalho
Posted on: Wed, 04 Sep 2013 16:36:53 +0000

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