Quando falamos de pobreza, a parte mais conhecida é a material, - TopicsExpress



          

Quando falamos de pobreza, a parte mais conhecida é a material, econômica, quantitativa, expressa em múltiplas carências como de renda, moradia, emprego, alimentação, etc. A pesquisa científica contribui para esta visão unilateral, à medida que prefere, por causa de seu método experimental, cenários mensuráveis, induzindo que o mais importante no fenômeno da pobreza é a dimensão que o método pode medir, não aquilo que mais compromete a vida do pobre. Esta “ditadura do método” (Morin, 2002), extremamente confiante em “evidências empíricas” típicas da perspectiva metodológica positivista/empirista (Haack, 2003. Giere, 1999. Demo, 1995), reduz o fenômeno àquilo que se pode mais facilmente manipular, deixando de lado o que talvez seja a dinâmica mais profunda da pobreza: sua politicidade. Ser pobre não é apenas não ter certas coisas. É principalmente ser destituído de ter e, em especial, de ser, um tipo de exclusão que tem em sua origem não só em carências materiais, mas mormente em imposições mobilizadas por processos de concentração de bens e poder por parte de minorias. Mera carência não gera pobreza necessariamente. Por exemplo, falta de chuva em certas regiões gera problemas de acesso à água, mas, sendo esta falta comum a todos os habitantes, não origina, por si só, pobres. Pobreza é carência politizada, no sentido de a carência servir para o favorecimento de alguns em detrimento de muitos. Seca gera pobreza quando aparece a “indústria da seca” (Demo, 2007), através da qual uma carência material se converte em ocasião para angariar privilégios e impor exclusões. Estudos e políticas centram-se, como regra, na pobreza dita “absoluta” - que compara o pobre consigo mesmo -, evitando discutir a pobreza dita “relativa” - que compara o pobre com as partes mais ricas da população. Pobreza não é situação isolada e isolável, que diria respeito apenas aos pobres, mas questão social que reflete a própria dinâmica socioeconômica e política da sociedade. Ninguém é pobre sozinho. É pobre em relação a outros, em contexto de polarização dialética. Pobreza não é simplesmente algo dado, por isso também inevitável ou próprio da sociedade, mas algo socialmente causado, imposto, mantido. Pode, pois, ser mudada. Prefere-se, porém, isolar o pobre, para alegar que o problema é dele, por vezes de sua incompetência ou indolência, isentando assim as outras partes da população, ou sugerindo políticas que não impliquem mudanças estruturais na sociedade. No fundo da dinâmica excludente da pobreza existe confronto político entre uns poucos que se apropriam de bens e poder e muitos que ficam de fora. “Ficar de fora” não é termo correto, porque, sendo pobreza parte integrante desta sociedade, os pobres estão dialeticamente incluídos, embora na margem, na periferia, tal qual numa unidade de contrários. Busco discutir neste texto a importância de introduzir nos estudos de pobreza a noção de pobreza política, sugerindo que a carência de cidadania possivelmente seja a dimensão mais grave nos pobres, porquanto esta carência impede que se tornem protagonistas de sua própria emancipação. Programas sociais atuais tendem, através de propostas apenas assistenciais, a manter os pobres como meros beneficiários, evitando que estes se confrontem com os mais ricos da sociedade. Não se trata de depreciar a questão material da pobreza, que continua muito grave. Ao contrário, propomos que é urgente agregar à preocupação com a questão material, a preocupação com a questão política, possivelmente ainda mais grave.
Posted on: Sun, 16 Jun 2013 22:26:43 +0000

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