Quem cria expectativas, por elas será criado A criação de - TopicsExpress



          

Quem cria expectativas, por elas será criado A criação de expectativas é um tipo de criação animal abstrata. Como um pastor de si próprio, o sujeito que cria expectativas está, em verdade, a criar espécies subjetivas de condicionamento pessoal. É um adestramento de respostas emocionais semelhante ao adestramento de um elefante no circo. A base do condicionamento é a mesma. Apreender o inesperado e evitar a dor. A diferença é que a dor subjetiva é representada por sentimentos de outra ordem. Enquanto se condiciona um elefante a base da brasa e do açoite, nós nos condicionamos à base da antecipação e supressão abstrata do medo. Um mecanismo psicológico que objetiva um grau de controle sobre a ansiedade perante um desfecho improvável, mas que paradoxalmente, aumenta essa ansiedade com relação à variação de possibilidades. Criar expectativas representa uma forma defensiva de tentar domesticar o inesperado segundo ideais apaziguantes de satisfação. O problema é que esse condicionamento tende a voltar contra ele mesmo, exatamente porque é um condicionamento ao avesso dos imputados aos animais. Os animais são levados a aprender o que esperar. São levados a ter determinadas expectativas que são sempre concretizadas – Pelo menos em primeira instância. Depois, quando o condicionamento estiver interiorizado, essa resposta pode não ser tão certa. Mas, no primeiro momento, o funcionamento condicional parte da premissa que, se agirem ou não agirem de tal forma, serão ou punidos ou recompensados. A nossa criação de expectativas visa, por outro lado, atenuar o não saber do que esperar. Agindo de maneira inversa ao condicionamento animal, o subterfugio da recompensa fica a cargo de uma confirmação do esperado que pode ou não ocorrer, e independe de uma ação especificamente condicionada do sujeito. Ou seja, equilibrar a bola com o focinho nem sempre lhe renderá peixes, pode lhe render açoite do mesmo jeito, ou, ao menos, não render nada. Isso leva ao outro lado do condicionamento que representa a criação de expectativas: a frustração e incapacidade de apropriação subjetiva do que foge ao controle. Nos frustramos ao não receber a recompensa desejada quando fazemos algo que nos condicionamos a entender que trará determinado benefício. A típica reclamação, por exemplo, de quem diz que agiu da melhor forma para alguém, mas não se vê recompensado. Num caso como esse, o ciclo é vicioso. A criação de expectativas condicionou um comportamento que atiçou ainda mais a criação de expectativas, o que resultou em elevação da frustração quando estas se viram não satisfeitas. E pior, em casos assim, a recompensa para o condicionamento é o próprio condicionamento. Levando em consideração uma noção de que atendendo determinado padrão, a expectativa será suprida, o natural é reforçar esse padrão. A recompensa é sempre o gosto pelo reforço de um padrão que - supostamente - resultará numa recompensa ulterior. Quando o sujeito cai nessa armadilha tautológica, a sua capacidade de observar alternativas quando algo escapa do controle do que esperado é consideravelmente diminuída. No primeiro sinal de frustração, sua avaliação não tende à reavaliação do padrão, mas à sua revalidação com mais assertividade. A acentuação consiste em conclusões do tipo que não modificam a base estrutural que determina o comportamento, apenas determinam fazer menos ou mais de certa ação já inscrita na sua estrutura, querendo conservar o mesmo grau de expectativas. "Se eu for mais carinhoso, ela vai me amar mais", "se eu for menos presente, ele vai me desejar mais" - e a expectativa, nesses casos, permanece constante - ser amado, ser desejada. O condicionamento só é alterado em termos quantitativos, mas não qualitativos. Alterar a qualidade é se dispor a alterar a raiz do comportamento, o que, por sua vez, implica em alterar o locus da determinação desse comportamento. Ou seja, alterar a expectativa e, principalmente, de onde vem essa expectativa e sua possibilidade confirmativa, pensar na dialética entre seu pasto natural e seu criadouro. Em geral, as expectativas são criadas internamente, mas dependentes de fatores que estão muito além do sujeito. Os peixes pelo seu bom equilíbrio focinhal vêm da plateia, dos adestradores, não de si. A expectativa é um bicho que não é seu, e que você toma como próprio, sem ser um criador competente. Ao invés de adestra-las, elas acabam, então, lhe adestram. Em suma, isso quer dizer que é melhor tentar restringir as expectativas àquelas que o próprio sujeito tem condição de suprir, por intermédio de ações autônomas. E mesmos essas são capciosas, pois que também podem determinar a cristalização de padrões quando os resultados não forem mais evidentes. Espera ser visto como bem vestido? Invista em pesquisar roupas que lhe caiam melhores, desenvolva seu estilo, saber que tipo de composição de roupas está em moda, e o quê que cada estilo transmite, etc. É uma forma ativa de atender as próprias expectativas. Ainda assim, isso não significa que o estilo que desenvolva vai ter aprovação social, ou que ele não vai cair em desuso na primeira curva da moda e tornar suas roupas lamentáveis objetos de museus, ou seu próprio corpo mudar... Caberá a você, portanto, administrar sua expectativa com relação à vestimenta quando as contingências chegarem. E se atentar para sua postura nessas circunstâncias. Ter consciência de que o condicionamento de vestuário que criou anteriormente para si e que pode ter sido muito bem visto na época já não é tão efetivo e escolher mantê-lo ou não, segundo seus predicados pessoais, ao invés de simplesmente manter uma relação inercial com o padrão outrora determinado, reforçando-o para mais ou para menos. Reforçá-lo para mais seria tornar um camaleão da alternância do estilo e se adestrar a seguir qualquer tendência, sem imputar nenhuma característica pessoa, que reforce sua identidade, a partir da moda disponível, reforça-lo pra menos seria manter um estilo ultrapassado, a despeito de mudanças de conceitos de vestimenta e, principalmente, a despeito de mudanças pessoais que demonstrem que o estilo não casa mais com quem você é. Nos dois casos, há um condicionamento cristalizado. Por um lado, a mudança a qualquer custo, sem se importar com a própria identidade. Por outro, a manutenção irrefletida do lugar-comum de uma identidade que existe menos por força subjetiva, representando quem a pessoa é, e mais por que já está instaurada. Sair do adestramento comportamental é ter a coragem de quebrar um padrão para encontrar um eu que mais se assemelha ao que se é em determinado estágio da vida, é modificar as expectativas com relação a si para se reencontrar. Levando em conta o exemplo acima, seria encontrar uma nova forma de se vestir que revigorasse a identidade, não deixando ela a mercê das variações da moda, nem a mercê de uma visão unilateral e previamente definida de si. Administrar expectativas atendíveis por si, assim, é sempre uma forma de se reinventar, em razão de que é uma forma de testar sua plasticidade, procurar possibilidades alternativas para seu desenvolvimento e satisfação. Quanto às expectativas que muito fogem da suas possibilidades de atendimento por conta própria, deixa-as in natura, qual um animal selvagem, ao invés de esforçar-se por domesticá-las. Mesmo porque domesticá-las seria o mesmo que castrá-las. Algo que a gente faz com cachorros e gatos, buscando diminuir-lhes os instintos e dar-lhes um grau de previsibilidade. Ora, que surpresa há em ver um elefante de circo fazer o que faz um elefante de circo? A plateia que aplaude quer, de fato, surpreender-se com o previsível. No final do lamentável ato, fica a pergunta: Quem, de fato, é o adestrado? Com isso, o aplauso parece até um esforço inconsciente para compensação da frustração do atendimento da expectativa. A criação de expectativas objetivas, cuja forma de satisfação se apresenta como única, tem essa via dúbia. Ela pode ser frustrada pelo seu não-atendimento - “Droga. Nada sai como eu quero”. E também pode ser frustrada pelo seu atendimento – “Ah. Era só isso mesmo...”. Muito melhor, então, saber apreciá-las na singularidade de seu evento imprevisível, para descobrir o traquejo fronte ao inesperado e cultivar o saudável desapego que prevê que nada, nem o mais certeiro, é duradouro. Até, porque, de vez em quando, até os elefantes de circo se revoltam contra os seus domadores. E eu acho isso ótimo. Lucas Carvalho - 04/09/2013
Posted on: Wed, 04 Sep 2013 19:38:12 +0000

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