Republico o texto acerca de principiologia contratual, editado com - TopicsExpress



          

Republico o texto acerca de principiologia contratual, editado com jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. DIREITO CONTRATUAL – OS DESDOBRAMENTOS DA BOA-FÉ OBJETIVA NOS CONTRATOS Autor: Thiago Rocha Trazendo a zetética para o campo contratual, podemos considerar a ontognoseologia jurídica de Miguel Reale - para quem o Direito é fato, valor e norma - como uma teoria de relevância para a compreensão do direito dos contratos. Explico. A dignidade da pessoa humana é valor-fonte que norteia outros valores dentro do ordenamento jurídico. Inspira, por exemplo, o próprio legislador na sua técnica de elaboração de cláusulas gerais, que são textos dos quais se extraem normas, sendo muitas delas princípios informadores de um determinado ramo do Direito. No caso do direito dos contratos, refiro-me ao PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. Insculpido no Código Civil em mais de um artigo no Livro “Dos Contratos”, esse princípio tem função de resguardar a eticidade e a cooperação entre as partes, bem como o cumprimento dos deveres anexos em todas as fases do contrato, como o dever de informação que os contratantes têm entre si, por exemplo. O desrespeito aos deveres de informação, cooperação, comportamento ético – deveres anexos – enseja violação positiva da relação contratual, gerando direito à indenização pelos danos materiais ou morais sofridos. O fato é que a boa-fé objetiva tem uma série de desdobramentos ou sub-princípios, dos quais se passa a tratar a partir deste momento. Tome-se como parâmetro o contrato de seguro. O Código Civil prevê que, nessa modalidade contratual, o segurado tem o dever de informar, o mais rápido possível, a ocorrência do sinistro ao segurador, e tem também de tomar TODAS AS PROVIDÊNCIAS PARA MINIMIZAR OS PREJUÍZOS QUE SUPORTA EM DECORRÊNCIA DO SINISTRO. Eis aqui, como se pode perceber, um dever do segurado relacionado com a boa-fé objetiva. É o sub-princípio denominado “duty to mitigate the loss”. O segurado, no lugar de agravar a situação de seu prejuízo, deve mitigá-lo, sob pena de perder a própria garantia. O STJ reconhece o instituto: “DIREITO CIVIL. CONTRATOS. BOA-FÉ OBJETIVA. STANDARD ÉTICO-JURÍDICO. OBSERVÂNCIA PELAS PARTES CONTRATANTES. DEVERES ANEXOS. DUTY TO MITIGATE THE LOSS. DEVER DE MITIGAR O PRÓPRIO PREJUÍZO. INÉRCIA DO CREDOR. AGRAVAMENTO DO DANO. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. RECURSO IMPROVIDO. 1. Boa-fé objetiva. Standard ético-jurídico. Observância pelos contratantes em todas as fases. Condutas pautadas pela probidade, cooperação e lealdade. 2. Relações obrigacionais. Atuação das partes. Preservação dos direitos dos contratantes na consecução dos fins. Impossibilidade de violação aos preceitos éticos insertos no ordenamento jurídico. 3. Preceito decorrente da boa-fé objetiva. Duty to mitigate the loss: o dever de mitigar o próprio prejuízo. Os contratantes devem tomar as medidas necessárias e possíveis para que o dano não seja agravado. A parte a que a perda aproveita não pode permanecer deliberadamente inerte diante do dano. Agravamento do prejuízo, em razão da inércia do credor. Infringência aos deveres de cooperação e lealdade. 4. Lição da doutrinadora Véra Maria Jacob de Fradera. Descuido com o dever de mitigar o prejuízo sofrido. O fato de ter deixado o devedor na posse do imóvel por quase 7 (sete) anos, sem que este cumprisse com o seu dever contratual (pagamento das prestações relativas ao contrato de compra e venda), evidencia a ausência de zelo com o patrimônio do credor, com o consequente agravamento significativo das perdas, uma vez que a realização mais célere dos atos de defesa possessória diminuiriam a extensão do dano. 5. Violação ao princípio da boa-fé objetiva. Caracterização de inadimplemento contratual a justificar a penalidade imposta pela Corte originária, (exclusão de um ano de ressarcimento). 6. Recurso improvido”. (STJ, REsp 758518 / PR RECURSO ESPECIAL 2005/0096775-4). Ainda: pode-se também falar no “tu quoque”, ou comportamento inadequado da parte do qual não se poderá extrair posterior proveito, em razão da própria eticidade. Exemplo nítido de “tu quoque”: art. 457 do CC, segundo o qual não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa era alheia ou litigiosa. Quem atrasa pagamento no contrato de seguro não tem direito à indenização em caso de sinistro, se este ocorre antes da purgação da mora (art.763 CC). Outro exemplo de “tu quoque”. Veja-se: “DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PACTUAÇÃO, POR ACORDO DE VONTADES, DE DISTRATO. RECALCITRÂNCIA DA DEVEDORA EM ASSINAR O INSTRUMENTO CONTRATUAL. ARGUIÇAO DE VÍCIO DE FORMA PELA PARTE QUE DEU CAUSA AO VÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. AUFERIMENTO DE VANTAGEM IGNORANDO A EXTINÇÃO DO CONTRATO. DESCABIMENTO. 1. É incontroverso que o imóvel não estava na posse da locatária e as partes pactuaram distrato, tendo sido redigido o instrumento, todavia a ré locadora se recusou a assiná-lo, não podendo suscitar depois a inobservância ao paralelismo das formas para a extinção contratual. É que os institutos ligados à boa-fé objetiva, notadamente a proibição do venire contra factum proprium, a supressio, a surrectio e o tu quoque, repelem atos que atentem contra a boa-fé óbjetiva. 2. Destarte, não pode a locadora alegar nulidade da avença (distrato), buscando manter o contrato rompido, e ainda obstar a devolução dos valores desembolsados pela locatária, ao argumento de que a lei exige forma para conferir validade à avença”. 3. Recurso especial não provido. (STJ,REsp 1040606 / ES RECURSO ESPECIAL 2008/0056046-1). Atualmente, a letra da lei é atenuada pela teoria do adimplemento substancial, no que tange ao atraso no pagamento. Para esta teoria, há contratos em que o cumprimento do devedor já se deu de uma forma tal que uma inadimplência mínima não pode ensejar a recusa da outra parte em cumprir a sua prestação no sinalagma. A seguradora, portanto, deve indenizar, em caso de sinistro e, posteriormente, deve buscar seu ressarcimento no que diz respeito ao inadimplemento do segurado. O STJ, sobre a referida teoria: “DIREITO CIVIL. CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL PARA AQUISIÇÃO DEVEÍCULO (LEASING). PAGAMENTO DE TRINTA E UMA DAS TRINTA E SEIS PARCELAS DEVIDAS. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DESCABIMENTO. MEDIDAS DESPROPORCIONAIS DIANTE DO DÉBITO REMANESCENTE. APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. 1. É pela lente das cláusulas gerais previstas no Código Civil de 2002, sobretudo a da boa-fé objetiva e da função social, que deve ser lido o art. 475, segundo o qual "[a] parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos". 2. Nessa linha de entendimento, a teoria do substancial adimplemento visa a impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor, preterindo desfazimentos desnecessários em prol da preservação da avença, com vistas à realização dos princípios da boa-fé e da função social do contrato. 3. No caso em apreço, é de se aplicar a da teoria do adimplemento substancial dos contratos, porquanto o réu pagou: "31 das 36 prestações contratadas, 86% da obrigação total (contraprestação e VRG parcelado) e mais R$10.500,44 de valor residual garantido". O mencionado descumprimento contratual é inapto a ensejar a reintegração de posse pretendida e, consequentemente, a resolução do contrato de arrendamento mercantil, medidas desproporcionais diante do substancial adimplemento da avença. 4. Não se está a afirmar que a dívida não paga desaparece, o que seria um convite a toda sorte de fraudes. Apenas se afirma que o meio de realização do crédito por que optou a instituição financeira não se mostra consentâneo com a extensão do inadimplemento e, de resto, com os ventos do Código Civil de 2002. Pode, certamente, o credor valer-se de meios menos gravosos e proporcionalmente mais adequados à persecução do crédito remanescente, como, por exemplo, a execução do título. 5. Recurso especial não conhecido”. (STJ, REsp 1051270 / RS RECURSO ESPECIAL 2008/0089345-5). Pode-se falar também na proibição do “venire contra factum proprium”, sendo esse um dos desdobramentos mais famosos da boa-fé objetiva. A parte, ao adotar um determinado comportamento numa relação contratual, presume ser aquele o seu posicionamento, segundo os deveres anexos de cooperação, informação e eticidade. Não poderá, portanto, incorrer posteriormente em comportamento contraditório, sob pena de caracterizar abuso de direito. Tal situação enseja reparação do dano causado. Outros desdobramentos da boa-fé objetiva seriam a “Verwirkung” (supressio) e a “Erwirkung” (surrectio). A doutrina alemã define a primeira como sendo o desaparecimento de um direito pelo seu não exercício ao longo do tempo. A consequência do desaparecimento de um direito é o nascimento de outro – “Erwirkung”, o contrário da anterior. O STJ já reconhece a aplicação dos institutos e, no Código Civil, existe o artigo 330, o qual menciona que o pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato (supressio). “CIVIL. CONTRATOS. DÍVIDAS DE VALOR. CORREÇÃO MONETÁRIA. OBRIGATORIEDADE. RECOMPOSIÇÃO DO PODER AQUISITIVO DA MOEDA. RENÚNCIA AO DIREITO. POSSIBILIDADE. COBRANÇA RETROATIVA APÓS A RESCISÃO DO CONTRATO. NÃO-CABIMENTO. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. TEORIA DOS ATOS PRÓPRIOS. SUPRESSIO. 1. Trata-se de situação na qual, mais do que simples renúncia do direito à correção monetária, a recorrente abdicou do reajuste para evitar a majoração da parcela mensal paga pela recorrida, assegurando, como isso, a manutenção do contrato. Portanto, não se cuidou propriamente de liberalidade da recorrente, mas de uma medida que teve como contrapartida a preservação do vínculo contratual por 06 anos. Diante desse panorama, o princípio da boa-fé objetiva torna inviável a pretensão da recorrente, de exigir retroativamente valores a título de correção monetária, que vinha regularmente dispensado, frustrando uma expectativa legítima, construída e mantida ao longo de toda a relação contratual. 2. A correção monetária nada acrescenta ao valor da moeda, servindo apenas para recompor o seu poder aquisitivo, corroído pelos efeitos da inflação. Cuida-se de fator de reajuste intrínseco às dívidas de valor, aplicável independentemente de previsão expressa. Precedentes. 3. Nada impede o beneficiário de abrir mão da correção monetária como forma de persuadir a parte contrária a manter o vínculo contratual. Dada a natureza disponível desse direito, sua supressão pode perfeitamente ser aceita a qualquer tempo pelo titular. 4. O princípio da boa-fé objetiva exercer três funções: (i) instrumento hermenêutico; (ii) fonte de direitos e deveres jurídicos; e (iii) limite ao exercício de direitos subjetivos. A essa última função aplica-se a teoria do adimplemento substancial das obrigações e a teoria dos atos próprios, como meio de rever a amplitude e o alcance dos deveres contratuais, daí derivando os seguintes institutos: tu quoque, venire contra facutm proprium,surrectio e supressio. 5. A supressio indica a possibilidade de redução do conteúdo obrigacional pela inércia qualificada de uma das partes, ao longo da execução do contrato, em exercer direito ou faculdade, criando para a outra a legítima expectativa de ter havido a renúncia àquela prerrogativa. 6. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ, REsp 1202514 / RS RECURSO ESPECIAL 2010/0123990-7)”. “Exceptio doli” é a defesa alegada pela parte contra a outra, sendo a mais famosa a “exceptio non adimpleti contractus”, segundo a qual ninguém pode exigir que alguém cumpra com a sua obrigação, sem que antes cumpra com a sua própria. Um julgado do STJ sobre o tema: “DIREITO CIVIL. CONTRATO BILATERAL. CONSIDERAÇÕES DOUTRINARIAS.INCIDENCIA DO ART. 1092, CC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. - NOS CONTRATOS SINALAGMATICOS, EM QUE INCIDENTE A EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRACTUS, PERMITIDO E AO CONTRATANTE RETARDAR O ADIMPLEMENTO DA SUA OBRIGAÇÃO ENQUANTO O OUTRO NÃO SATISFAZ A SUA”. (STJ,REsp 5213 / PA RECURSO ESPECIAL 1990/0009466-6). Esses são os desdobramentos da boa-fé objetiva, podendo-se perceber que existe toda uma principiologia em termos de direito dos contratos. E, conforme já mencionado, o alicerce dessa gama de sub-princípios é a dignidade da pessoa humana, atributo do ser humano que informa tanto o direito público, como o direito privado.
Posted on: Sun, 15 Sep 2013 15:21:39 +0000

Trending Topics



Recently Viewed Topics




© 2015