Sobre falsas autoridades Sartre, Sargent e o Nobel Por Luiz - TopicsExpress



          

Sobre falsas autoridades Sartre, Sargent e o Nobel Por Luiz Gonzaga Belluzzo Na edição de 22 de outubro de 1964 do jornal "Le Monde", Jean Paul Sartre recusou o Prêmio Nobel de Literatura em carta endereçada à Academia Sueca. Na gentil recusa que enviou aos membros da academia, Sartre escreveu: "Esta atitude é baseada em minha concepção do trabalho de escritor." Prossegue: "Um escritor que assume posições políticas, sociais ou literárias somente deve agir com os meios que lhe são próprios, isto é, com a palavra escrita... O escritor deve, pois, negar-se a se deixar transformar em Instituição, mesmo que isso se verifique pela mais honrosa forma, como no caso presente... Não posso aceitar nenhuma distinção concedida pelas altas instâncias culturais, tanto do Leste quanto do Oeste, mesmo que admita sua existência." O leitor há de perguntar da oportunidade de se relembrar o episódio de 1964 na segunda década do terceiro milênio. Laureado com o Prêmio Nobel, o economista Thomas Sargent foi convidado pela Bolsa Mercantil e Futuros de São Paulo para participar de um seminário em Campos do Jordão. Sargent, assim como a maioria dos nobelistas do gênero, não produziu sequer um soluço a respeito da crise financeira, cujas nuvens tormentosas já eram visíveis desde os anos 80 do século passado. Entre os minoritários que opinaram sobre os primeiros sinais da crise, sentou-se na cumeeira da insensibilidade econômica o festejado Robert Lucas. Lucas, também agraciado com o Nobel, é conhecido por suas tabelinhas intelectuais com o supracitado Sargent. Constrangidos pelos interesses (too big to fail), autoridades se juntaram para promover o desastre Em um de seus habituais exercícios de escapismo do mundo dos mortais, Lucas publicou no "Wall Street Journal" o artigo Hipotecas e Política Monetária (Mortgage anda Monetary Policy. Àquela altura do campeonato, o preço das residências já despencava com grande estrondo. Até mesmo os mais fanáticos crentes na eficiência dos mercados estariam incomodados com o barulho. Mas, Lucas não é apenas um crente, é um sacerdote. Paramentado com as vestes das expectativas racionais, ele escreveu no Journal: "Sou cético a respeito do argumento que sustenta haver risco de contaminação de todo o mercado de hipotecas pelos problemas surgidos na faixa subprime. Tampouco acredito que a construção residencial possa ser paralisada e que a economia vá deslizar para uma recessão. Cada passo nessa cadeia de argumentação é questionável e nada foi quantificado. Se aprendemos alguma coisa da experiência dos últimos 20 anos é que há muita estabilidade embutida na economia real". Alfred Nobel não incluiu os economistas no rol de pesquisadores e cientistas habilitados a receber o prêmio. O Banco Central da Suécia, imprudentemente, incumbiu-se de perpetrar a entronização dos sábios da ciência triste no panteão dos benfeitores da humanidade. A partir de então, a economia acentuou as ansiedades de se transformar em um "ramo menor da matemática mal aplicada ", como sentenciou recentemente André Lara Rezende, ao anunciar sua condição de ex-economista. Sargent chegou ao Brasil no momento em que, como de hábito, naufragaram as previsões desatadas nas últimas semanas a respeito do crescimento do PIB. O leitor não ignora que as consultorias estão recheadas de economistas formados nas escolas americanas onde pontificam os clones de Sargent. Ao desembarcar, o sábio das expectativas racionais proclamou: "Há um famoso teorema devido a Neil Wallace que diz que, sob algumas condições específicas, esses programas de compra de ativos são irrelevantes. Eles não fazem bem ou mal" Trata-se da irrelevância das aquisições de papéis públicos e privados pelo Federal Reserve, a política de Quantitative Easing. A irrelevância da ação de Ben Bernanke resultou na salvação de bancos e ainda sustenta a débil recuperação americana. Débil, mas melhor do que nada. A propósito da relevância ou irrelevância das políticas monetárias, topei com o artigo domingueiro do ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles na "Folha de S. Paulo". Sustenta Meirelles que a crise desatada há cinco anos deve ser creditada às intervenções do governo nos mercados financeiros. Esse pecado, segundo ele, foi cometido mediante a ação imprudente das agências "garantidoras" de crédito Fannie May e Freddy Mac. Com o propósito de dirigir e facilitar o financiamento às classes de baixa renda - a turma do subprime - as agências criaram as condições para os desatinos da securitização dos créditos imobiliários e para a alavancagem imprudente. Se o ex-presidente do BC se entregasse ao estudo das peripécias que levaram à desregulamentação financeira, poderia compreender que, sob o acicate das crenças liberalóides e, sobretudo, docemente constrangidos pelos interesses do oligopólio financeiro global (too big to fail), o Congresso, o Federal Reserve, a Securities Exchande Comission e tutti quanti se juntaram para promover o desastre, entoando o canto das sereias dos mercados eficientes, hipótese destilada nas retortas das teorias das expectativas racionais. Os governos interferiram sim, mas para liquidar as regras da repressão financeira que garantiram a estabilidade e o crescimento das economias ao longo de três décadas na posteridade do pós- guerra. Não por acaso, quando a crise do Lehman Brothers bateu no Brasil e o PIB iniciou o mergulho de 2009, Meirelles subiu a taxa de juro. Luiz Gonzaga Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda é professor titular do Instituto de Economia da Unicamp e escreve mensalmente às terças-feiras. Em 2001, foi incluído entre os 100 maiores economistas heterodoxos do século XX no Biographical Dictionary of Dissenting Economists. Facebook Twitter Linkedin Google Plus E-mail TOPO VERSÃO CLÁSSICA © Copyright Valor Econômico S.A. All rights reserved
Posted on: Tue, 03 Sep 2013 11:34:38 +0000

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