Sou o sujeito mais bisbilhoteiro que conheço. Adoro fuçar a vida alheia, com ou sem permissão de seus protagonistas. Certa vez, visitei um apartamento antigo no Rio de Janeiro, alegando que tinha a intenção de alugá-lo. Mentira. Eu queria era conhecer o interior do imóvel, construído provavelmente nos anos 20, época que me fascina. Era lindo. Parecia uma mansão suspensa. Entrei nos quartos, fucei gavetas, armários e guarda-roupas. Encontrei dezenas de fotografias preto & branco jogadas sem piedade num canto qualquer de uma gaveta semi-destruída. No verso das fotos estava o relato de fatos e situações tão variadas quanto maravilhosas. Isso me ajudou a entender que o apartamento pertencera a uma rica e influente família estrangeira que morou alguns anos no Rio. Um senhor de aparência austera aparece numa foto ao lado de Getúlio Vargas. Outra mostra a família no Cairo, camelos e pirâmides ao fundo. Esta fotos estão comigo até hoje. Entenda: não as roubei – simplesmente as preservei da completa destruição ou do melancólico olvido. No máximo, aceito ser chamado, mas no sentido poético, de ladrão de memórias. É nisso que consiste a minha bisbilhotice: recolho indiscriminadamente vozes, relatos, figuras, cenas, fotos, filmes, fantasias, verdades e mentiras, a alegria e o desespero, todo este impressionante manancial de vida que jorra ao meu lado, pois eu preciso de tudo isso e muito mais para me sentir incluído numa existência que é tão grande e fascinante que eu, ser poderoso e múltiplo, não me basto a mim mesmo.
Posted on: Tue, 17 Sep 2013 13:06:51 +0000
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