Vida Judiciária, Outubro de 2013 Vida Judiciária: Para - TopicsExpress



          

Vida Judiciária, Outubro de 2013 Vida Judiciária: Para finalizar, gostaria de lhe pedir uma/duas ideias centrais sobre aquilo que deveriam ser, em sua opinião, as prioridades do Governo em matéria de segurança social e como forma de garantir a sua sustentabilidade. Se fosse ministra da tutela o que faria? Raquel Varela: Devolvia todo o dinheiro roubado. Torno a dizer que é roubado porque as pensões e reformas são salário social – é um salário diferido no tempo. São remunerações do trabalho feito pelos trabalhadores. Suspendia o pagamento da dívida pública, que é uma renda fixa de capital. Era de 70% do PIB em 2008, agora é de 130%. O chamado resgaste é inteiramente um resgate da banca. Produzimos 100 e pagamos 130. Isto é possível? Não. O que faria mais? Iniciava um programa geral de pleno emprego com redução do horário de trabalho sem redução salarial. A segurança social voltava imediatamente a ser superavitária. Quem perdia? Quem tem…contas na Suíça! A Alemanha invadia-nos? Seria uma novidade histórica num contexto destes. Suspendiam os investimentos? E as consequências que isso teria em toda a Europa? Pergunto eu, se me permite: como olhariam para nós os outros povos da Europa? Falo dos povos da Europa, não dos actuais dirigentes políticos. Olhar-nos-iam como uns caloteiros que falharam o pagamento de uma dívida honrada ou como um povo corajoso que seria daí para a frente um exemplo de resistência e civilização? Podia mentir e responder que faria uma renegociação da dívida favorável, propunha eurobonds… Mas isso é uma utopia histórica, assente na ideia de que na Europa seria possível um movimento como o que unificou os EUA nos séculos XVIII e XIX. Isso aconteceu no quadro do início do desenvolvimento histórico do capitalismo. Estamos no século XXI, acreditar que essa solução é viável descansa as consciências, mas não impede a regressão social porque é o mesmo que acreditar que os empresários alemães vão abdicar de uma parte dos seus lucros para os trabalhadores portugueses, gregos, alemães. O que se verifica hoje é que a Europa não está a resistir, de forma civilizada, isto é, sem impor retrocessos sociais, à sua primeira grande crise. 50 milhões de desempregados, precarização e generalização dos empregos parciais com baixíssimos salários, descapitalização da segurança social – este é o cenário europeu. Com sinceridade, eis o que pondero: estamos em cima de um 1929. Estou convencida disso. Pode ser que me engane. Mas se eu estiver certa, e tantos outros colegas que pensam o mesmo, o sistema financeiro mundial teria colapsado em 2008 sem ajudas milionárias. Mas essas ditas ajudas não caem do céu. A sociedade tem limites produtivos, um bolo que não cresce indefinidamente. A conta foi enviada para o único lugar que produz – salários e pensões (salários diferidos). Porque esta crise deixou claro que dinheiro não produz dinheiro – a economia de casino só existe se e quando se valoriza na produção real. Isto é numa palavra, nos salários. Estamos em cima de um 1929 ou pior porque a acumulação foi muito maior, porque estamos no meio de um processo de globalização muito mais extenso. Temos de fazer escolhas, que não são mais possíveis no quadro da proposta keynesiana de esquerda de que lucros e salários podem crescer juntos. Há um keynesianismo de direita que é o militarismo, a criação de uma economia de guerra, que é como têm vivido os EUA, parcialmente desde a II Guerra Mundial. Ora, estamos numa fase, acho, em que ou crescem os lucros ou os salários, e se forem os salários a baixar isso tem um significado – queda geral dos padrões sociais de civilização, crescimento da barbárie. Este ano venderam-se em Portugal 75 000 comprimidos por dia para doenças do foro psíquico, há 100 mil crianças em risco, generalizam-se as cantinas sociais (a nova sopa dos pobres), há 1 milhão e 400 mil desempregados. Isto não é uma expressão de barbárie social? Temos de ter coragem para impedir isto – pelos pensionistas, pelos nossos pais, avós, mas também por nós e pelos nossos filhos. Raquel Varela
Posted on: Fri, 08 Nov 2013 20:47:52 +0000

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