poeira A distância matará o que sinto. As lembranças que tenho - TopicsExpress



          

poeira A distância matará o que sinto. As lembranças que tenho virarão poeira que limparei no dia depois de amanhã. Esquecer tudo que fez parte de mim diante esses tempos que pareceram fáceis, sublimes e belos. Esquecer é apagar com borracha feita de lágrimas e partidas fictícias. Somos poeira. E quando limpares com pano molhado a poeira escura que se instala no chão da sala, eu também estarei saindo. Eu não sei onde eu estou e nem mesmo se volto à poeira originária de tudo. Ou a fumaça do cigarro daquela noite em que a lua estava cheia e eu discutia Adorno com gente que nunca tinha lido Adorno. É claro e óbvio que tudo agora é escrito para que tu leias. E é mais claro ainda o motivo: de longe, eu posso pensar sem teus eflúvios e, de mais longe ainda, eu posso te afastar de mim só por essas palavras frias e insensatas jogadas no escuro. Eu vou correr para me afastar e vou fugir dos teus braços longos. Eu não vou lembrar de nada. Tudo começa quando há brilho. A luz pálida da lua nos trouxe presentes noturnos. Porém, o brilho da lua é pálido reflexo do sol. O sol existe. A lua não. Assim é tudo, iluminados pela lua cheia nós nos iludimos, passando de brilho a brilho, nos achando eternos e infalíveis. Mas o que está dentro de mim ainda grita por existência e é isso que você não enxerga quando a noite cai e a lua não nos ilumina. Eu sou algo que não existe. Eu sou a solidão inerte, mas não sou semente. Pois de mim, não se espera que nada nasça a não ser esta caligrafia pífia de palavras insensatas e impensadas. Não peço perdão, me utilizo de qualquer coisa que me rodeia para falar do que há de mais profundo em mim. E na minha profundidade não há nada senão morbidez. Nada é especial. Sou rasa, superficial e brilho como uma fogueira recém-acesa. No outro dia, porém, sou apenas cinzas e pó. O brilho dos meus olhos não é meu. O brilho que vês é teu próprio brilho refletido. Sou lua. Sou reflexo. Sou um espelho partido em mil pedaços. Minha luz é a que emanam para mim. Sou lua traiçoeira, que engana e foge. E eu já estou indo. Eu não vou querer lembrar de nada. E este texto é proibido, essas palavras me condenam. Qualquer coisa me algema e me prende. Não sei mais onde estou e não me sinto segura em sentir esse toque. Toque suave e quente que me enleva. O que será? Caverna de pedra, escura e funda na rocha eterna que me cobre. Daqui não vejo saída. Nem quero, estou muito bem protegida. O sol não entra, as plantas não crescem e não há animais. Eu durmo, no escuro, com a cabeça a repousar num chão de terra batida. Durmo há séculos, durmo há milênios. Não me interrompa. Não tente me acordar. Existem duas ou três ou quatro de mim. Se tu despertas a errada... Não restará nenhum pedaço de teu corpo. Sou fera, sou estrela, sou menina, sou lua. Quatro pirâmides. Quatro animais. Sou tigresa, sou passarinho, sou borboleta e sou serpente. Quatro pontos cardeais, quatro flechas de sagitário, quatro quadrados perfeitos. Quatro números que me trancam na caverna. A senha sagrada de permanência na caverna. Sem encontrar-se com a morte. Mas não é esse seu destino. Despertar-me e me libertar dessa trova obscura que se ouve por todo o deserto. O silêncio das magias sagradas das areias do Saara. O silêncio dos barcos em Ceilão. O silêncio das deusas da Grécia. O silêncio do canto druídico na Irlanda. Avalon está em brumas... e eu adormeci para ser eterna. Mas não é esse seu destino. Despertar-me e me libertar desse compromisso antigo que me cega e prende, que me amarra e deixa prostrada sob a égide desse universo de sono eterno. Sono das pirâmides eternas. Sono da Esfinge morta. Sono em que não há mistério, nem sonho, nem utopia, nem alegria. Eu adormeci para ser eterna. E deixei de existir para esse mundo porque vivo em Outro. Mas não é esse seu destino. Despertar-me e me salvar de mim, do Mundo e do Destino que me escolheu. Não é teu o fardo de lutar contra o dragão do Esquecimento. Não é tua a luta contra o cavaleiro da Morte. Não é tua a luta contra meu próprio coração desperto e as incertezas que me povoam os pensamentos. Nada é teu e eu não estou aqui. Esta porta de pedra nunca se abrirá diante dos teus olhos. Os meus olhos estão fechados e assim continuarão para sempre. Tenho que pensar, mas tenho que escrever sem pergaminho nem pena. Escrevo no pensamento desses pixels que me infartam o coração e me enchem os olhos de lágrimas. Virtuais. De cansaço mental. Tenho que pensar antes de jogar isso no mundo. Eu cito demais, eu falo de você. Você vai embora e eu peço isso. Tudo é impossível, tudo acaba. Nada é infinito. Estou cansada. Mas quando eu estiver leve outra vez, como o toque suave da primavera. Nada vai ser tão eterno quanto esse texto. Eu vou me culpar e blasfemar. Mas vou cantar alguma coisa. Escrevo porque tenho horror ao silêncio da mente. Esse esvaziamento da mente me destrói ao invés de trazer paz. Se eu sou Ego, o que acontece se o Ego se desfaz? Mas também não posso falar daquela palavra proibida. Eu não sei se é proibida, eu posso estar exagerando, eu sempre exagero demais. E sempre estou errada, mas não dessa vez. O mistério encobre a palavra proibida. O mistério encobre o que está dentro de tudo e as palavra são máscaras aqui também se você tiver paciência para decifrá-las. Tudo são enigmas vazios. Infinito vazio. "Enjoy the silence..." Inside "enjoy", we find real joy. E eu não sei me calar e nem posso. Nem devo. Meu destino é seguir falando o que ninguém fala. É pronunciar o credo sem crer. É ter fé mesmo quando tudo é inexato e improvável. Sem buscas e sem respostas. Minha sina e falar do infindável e seguir me repetindo até o fim dos tempos dessa vida de misérias, de saudades, de silêncios. Minha sina é encher o silêncio de palavras inúteis para não ouvir o som do meu coração. Meu destino é fugir de mim mesma até encontrar-me no fim da vida e me arrepender de ter sido infeliz e ter escolhido continuar mesmo depois de ter conhecido a alegria que mora no brilho dos teus olhos. Eu não sei me calar e não devo. Deixo sair as piores coisas, as palavras mais malditas e tudo que grita não se silencia porque não tem fim. O fim é a repetição eterna e inválida. Amenidades suaves de dia, dores lancinantes à noite. Tudo é besteira porque a verdade não sai de mim. Eu não sou um enigma, eu sou meramente calculista e fria, sem sentimentos clássicos, só loucura e solidão. Falo de tudo e sei de tudo para me esquivar de mim mesma com mais facilidade. Não me olhe assim, você já sabia. Meu nome é solidão. E estou num sótão escuro sentada numa cadeira com uma estante de livros à frente. Não leio, degusto as páginas e me transfiguro em qualquer coisa. Não sou poeta. Não sou escritora. Não sei a voz que me toma os versos, não sei as vozes que me comandam a vida. Não são as minhas. Não é minha voz porque ela está quieta, guardada no mesmo baú de cadeado trincado no qual descansam minhas asas, minha alma e meu coração. Você não sabe o que diz. E eu não sei o que ouço. Tudo está errado e eu vou embora. Vou me transformar em outra coisa. Vou fundar outro absurdo. Vou escrever outro texto sendo o contrário deste. Vou dizer o proibido, vou andar sozinha sem medo. Vou me fechar aqui pra sempre. Eternamente. Eu não tenho caminho porque nunca saí do lugar. E é por isso que tudo de mim gira em torno de mim. Olho para mim mesma à distância e vejo que sou poeira embaixo do tapete da sala. Varra-me para fora e jogue água. Livre-se de mim.
Posted on: Fri, 05 Jul 2013 04:28:56 +0000

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