A espuma dos dias, por Marcelo Costa - Michel Gondry não é um - TopicsExpress



          

A espuma dos dias, por Marcelo Costa - Michel Gondry não é um diretor fácil. O fato de o cineasta francês explorar os limites do bom e do mau gosto tecnológico provoca o espectador sentado na zona de conforto. A grande questão é que, muitas vezes, o acabamento rocambolesco visual confunde e inibe o espectador desacostumado fazendo com que ele nem perceba que está diante de uma história simples (e, em alguns momentos, simplória). Eis um cineasta fazendo cinema pra si mesmo, e o espectador que aceite. Porém Gondry tem o dom de ultrapassar fronteiras e estragar boas ideias. Acalme-se: isso não acontece com “A Espuma dos Dias” (2013). Inspirado no romance surrealista de Boris Vian, “L’Ecume des Jours”, de 1947, “A Espuma dos Dias” conta a história de Colin (Romain Duris, meio paspalho, como sempre), um jovem bem de vida, que passa os dias provando da culinária espetaculosa de seu cozinheiro Nicolas (Omar Sy, ótimo) enquanto desenvolve um pianocktail (contração de piano e cocktail, uma palavra inventada por Vian), instrumento que cria coquetéis conforme a canção que está sendo tocada. “Se você quiser algo mais forte, toque notas baixas”, diz Colin para o amigo Chick, um consumidor voraz da obra de Jean-Sol Partre (sim, é esse mesmo o nome). Certo dia, enquanto conversam na mesa de almoço surrealista (totalmente Gondry, com enguias em fatias dançantes), Chick conta que conheceu uma garota, Alise (a bela Aïssa Maïga). O cozinheiro Nicolas aproveita e fala de seu caso com a linda ricaça Isis Ponteauzanne (Charlotte Le Bon), o que abre o precedente para Colin desabafar: “Eu também quero me apaixonar“. Desejo pedido, desejo realizado. A escolhida é Chloe (Audrey Tautou, eternamente Amelie), e Colin se dedica para conquistar a moça: aprende a dança da moda e a leva para um passeio maluco por Paris. O casal se apaixona e, bingo, começa o sofrimento. Ok, não é tão simples assim (há mais, muito mais). Crítico ferrenho da Revolução Industrial e da Igreja (e, por que não, do amor?), Boris Vian (Gondry é fidelíssimo nesse quesito) dispara fogo pra tudo quanto é lado. As indústrias são apresentadas como lugares que roubam a alma (e o calor) do empregado, que será demitido sumariamente se tiver prejuízo em seu turno. Já a Igreja é apresentada (em duas passagens, uma delas crudelíssima e realista) como uma sinistra seita mercantilista. E há também o amor, esse velho vilão tão conhecido por todos, e Vian não o perdoa. E o que o casal Colin e Chloe tem a ver com isso? Simples: eles se casam, e no meio da lua de mel, uma flor de lótus adentra o pulmão esquerdo da garota. Conforme cresce, a dor aumenta, e quando a musa desmaia pela segunda vez, Colin decide leva-la a um hospital, e começa aqui (após uma primeira parte colorida, festeira e sorridente, como o amor) a segunda parte do filme, que cai como uma luva em um mundo dominado por planos de saúde, que podem salvar sua vida, desde que você seja associado. Para tentar salvar Chloe, Colin usa todo o dinheiro que tem (quase todo, afinal, uma quarto do dinheiro é destinado para o amigo viciado em filosofia – e a filosofia é apresentada como uma droga perigosa, e uma cena, em que os dois amigos ingerem uma pílula que contém um capitulo do livro de Jean-Sol Partre, é bastante elucidativa sobre o assunto), mas o tratamento custa muito caro e tudo começa a ruir (o que era colorido começa a ficar preto e branco; o que tinha vida começa a criar teias de aranha). Tanto Boris Vian quanto Michel Gondry não facilitam. O recado, explicito, parece brilhar em luzes de neon: não faça como Colin, não se apaixone. A porrada que o filme desfere na face do amor deixa o peito do espectador amortecido. Há uma parafernália de objetos, máquinas, animais, um mundo em ação no filme, tudo isso com o intuito de desviar a atenção, pois a história é tão simples que é impossível conter o gosto amargo que desce a garganta quando se percebe o intento (maléfico?) dos autores. Michael Haneke se despiu de alegorias para filmar uma das grandes alegorias românticas do ano passado (e dos últimos anos), “Amor”. Michel Gondry não: ele usa tudo que pode para que o espectador termine a pipoca, solte algumas gargalhadas, e caminhe de mãos dadas com o cineasta sem perceber que está afundando em uma areia movediça cinematográfica, no lodo de um pântano. É possível recrimina-lo pelo exagero? Claro. Mas seu mérito em compartilhar a terrível dor de uma doença com o público merece palmas. É complicado falar em atuação quando o filme em si parece ser um personagem. A sensação é de que Michel Gondry quis ser mais surreal que Boris Vian (ou será uma artimanha do olhar contra a imaginação?), e com o livro sendo reeditado (via Cosac Naif), fica o leitor espectador como juiz do intento. No entanto, prepare-se para sofrer (ao som de jazz). Não tente evitar. Se não for assistindo ao filme será amando alguém, trabalhando em um emprego escravocrata ou tendo que vender seus sonhos para pagar casamentos, hospitais, funerais e bombeiros. E cuidado com a filosofia. Ela confunde, vicia, mas não salva…
Posted on: Tue, 09 Jul 2013 20:36:47 +0000

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