O DESREGRAMENTO DOS COSTUMES NA AMÉRICA PORTUGUESA, a partir dos seiscentos, talvez impressione como justificativa para uma cultura que hoje se sobressai em vícios, talvez menos impressionantes porque cultura. Naquele tempo, a irrequietude do ‘estado de pecado’ envolvia o clero, sobretudo a sociedade colonial. A transgressão religiosa preenche centenas de páginas de documentos. Em nome da fé, das práticas mais indulgentes às atrocidades inaceitáveis, muito se justificou e se encobriu no processo de colonização das terras brasílicas. A colônia era o lugar do pecado. Cito algumas violações comuns àquela época que duraram mais de um século: paganismo, feitiçaria, canibalismo, poligamia, incesto, concubinato, sodomia, fornicação, sacrilégio (coito com clérigo ou freira)... Nalgumas dessas, achava-se a padralhada, como se vê. Convém sublinhar que toda expansão amorosa que resultasse em simples prazer era proibida – a castidade dos sentimentos na cama deveria estar acima de tudo e abaixo de deus (o mesmo que solicitar bons modos a uma raposa dentro do galinheiro). Mas o pecado tinha o privilégio de coabitar na América Portuguesa porque um dos principais fatores para tanto era a baixa densidade populacional. Fartavam sítios adequados ao cabritismo, faltavam olhares mexeriqueiros. Naturalmente, nem tudo às escondidas passou desapercebidamente. Mas, o olhar severo dos inquisidores atravessou o Atlântico para intimidar as lubricidades da colônia e seus agentes do Demônio. O Santo Ofício chegou um dia a essas terras e não se deitou embaixo do coqueiral, mas cuidou de seus afazeres atemorizantes. Para nosso espanto – e aqui sou obrigado a registrar a verdade e, ao mesmo tempo, pedir desculpas ao Reverendo Muricy – a primeira pessoa a ser ouvida pelo ‘tribunal’ trazia acusações de pederastia: um sacerdote. (Minhas curiosidades brasílicas).
Posted on: Thu, 05 Sep 2013 02:38:19 +0000
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